Temas

de

fundo

1ª leitura (Sir 3,3-7.14-17a):  Quem honra o pai obtém o perdão dos pecados e quem honra a mãe é semelhante a quem acumula tesouros. Quem respeita o pai encontrará alegria nos seus filhos e o Senhor ouvirá a sua oração. Quem honra o pai gozará de longa vida e quem obedece ao Senhor dará consolação à sua mãe. Quem teme o Senhor honra o seu pai. Quem teme o Senhor servirá, como a seus senhores, aqueles que lhe deram a vida. A piedade que exerceres com o teu pai não será esquecida, mas será tida em reparação dos teus pecados. Então, no dia da aflição, o Senhor lembrar-se-á de ti; e os teus pecados dissolver-se-ão como o gelo em pleno sol. É um blasfemador quem desampara o seu pai e é amaldiçoado pelo Senhor quem irrita a sua mãe.

* Quem teme o Senhor honra os pais. O livro de Ben Sirá, também conhecido, antes, por Eclesiástico, é um escrito sapiencial cheio de ensinamentos práticos. É uma espécie de súmula de conselhos que um pai dá aos seus filhos. Ora, eu acho que é assim que deve ser lido. Na lista dos livros do AT, trata-se de um livro bastante recente (não antes do séc. II a.C.) e tenta também fazer uma espécie de aproximação à cultura (inculturação) em que o autor se encontra, que é a cultura grega. Nesse aspecto, não se pode negar que há no autor uma preocupação de «aproveitar» tudo o que de bom há na nova cultura. Sendo assim, se calhar, é um exemplo a seguir no sentido de adaptar a linguagem cristã às diferentes culturas em que tem que se operar. Quanto aos conselhos práticos, penso que não haja nada que explicar. Só têm é que ser ensinados às pessoas de hoje, para que se volte a ter para com os pais e com os mais idosos em geral aquela consideração que lhes é devida, porque disso também depende a felicidade o bem-estar e a felicidade dos mais novos. Neste capítulo, há realmente muito a fazer.

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2ª leitura (Cl 3,12-21):  Como eleitos, santos e amados de Deus, revesti-vos de sentimentos de compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência. Sede, pois, tolerantes uns para com os outros e perdoai-vos mutuamente, sempre que alguém tenha razão de queixa contra outro. Deveis perdoar-vos uns aos outros, como o Senhor vos perdoou a vós. E, acima de tudo, esteja a caridade, que é o vínculo da perfeição... E tudo quanto fizerdes por palavras ou por obras, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando graças por Ele a Deus Pai. Esposas, sede submissas aos maridos, como convém aos que são do Senhor. Maridos, amai as esposas e não vos exaspereis contra elas. Filhos, obedecei em tudo aos vossos pais, porque isso é agradável ao Senhor. Pais, não irriteis os vossos filhos, para que não caiam em desânimo.

 

* Sede tolerantes uns para com os outros. Este trecho da Carta aos Colossenses (e que trata, digamos assim, de fazer a aplicação duma parte mais doutrinal à vida prática e concreta) foi escolhido, como é bom de ver, para ilustrar o tema geral deste domingo dedicado à família - na festa da Sagrada Família. Em relação a esta leitura, suponho que será útil não fixarmos a atenção apenas naquilo que nos parece «discutível», como, por exemplo, o conselho a que as esposas sejam submissas aos maridos. De resto, isso só é «discutível» se não se ler todo o contexto. O enfoque deve ter a ver, em primeiro lugar, com a fórmula de em tudo agir «no Senhor». No fundo, o que Paulo quer dizer é que tem que haver respeito por todos, porque isso o exige o Senhor. E sobretudo nunca deve ser esquecido o seguinte: o que deve prevalecer, «acima de tudo, é a caridade, que é o vínculo da perfeição». A partir do momento em que o cristão aprender a fazer tudo em nome de Jesus, ganhará a capacidade de construir na perfeição da caridade.

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Evangelho (Lc 2,41-52):  Os pais de Jesus iam todos os anos a Jerusalém, por ocasião da Festa da Páscoa. Ora, quando Ele chegou aos doze anos, subiram até lá, segundo o que era costume. Terminados esses dias, eles regressaram a casa. Mas o menino ficou em Jerusalém, sem que os pais se dessem conta disso. Pensando que Ele encontrava na caravana, fizeram um dia de viagem e, depois, começaram a procurá-lo entre os parentes e conhecidos. Não o tendo encontrado, voltaram a Jerusalém à sua procura. Três dias depois, encontraram-no no Templo, sentado entre os doutores, a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas. Todos quantos o ouviam, estavam estupefactos com a sua inteligência e as suas respostas. Ao vê-lo, os pais ficaram assombrados. Então a sua mãe disse-lhe: «Filho, porque nos fizeste isto? Olha, o teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura!». Jesus respondeu-lhes: «Porque me procuráveis? Então não sabíeis que devo estar na casa do meu Pai?». Mas eles não compreenderam as palavras que lhes disse. Depois disso, desceu com eles, voltou para Nazaré e era-lhes submisso. A sua mãe guardava todas estas coisas no seu coração. E Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça diante de Deus e dos homens. 

 

* Não sabíeis que devo estar na casa do meu Pai? A chamada Lei de Moisés prescrevia aos judeus três peregrinações por ano (cf. Ex 23,14-17; 34,22-23; Dt 16,16), mas havia uma peregrinação que se revestia dum significado especial. Sem entrar em explicações técnicas, tratava-se do momento em que os filhos (varões), por volta dos doze anos - como foi o caso de Jesus, segundo o texto - tomavam oficialmente consciência dos seus deveres religiosos a cumprir, mesmo sem necessidade de lhes serem lembradas as regras e as indicações por parte dos seus pais. De alguma forma, pode-se dizer que, a partir dos doze anos, como que começavam a «ser adultos na fé». Em certo sentido, era como hoje deveria ser o rito e o sacramento do Crisma para o cristão. Seja como for, parece-me que a mensagem mais relevante, na óptica do evangelista Lucas, é descrever a realidade de que, a partir deste momento, esta espécie de ruptura com os pais é, para Jesus a confirmação de que a vontade de Deus transcende toda e qualquer outra vontade, mesmo a dos pais terrenos. É, pois, uma passagem com um forte «sentido teológico» e que é aplicável a todo o tipo de paternidade e de filiação.

PARA ULTERIOR APROFUNDAMENTO, VEJA EM BAIXO. 

  

*   Quem honra

     os pais alcança

     o perdão

     dos pecados.

  *Tudo quanto fizerdes

     fazei-o em nome do Senhor.

  *Porque

     me procuráveis? Eu tenho

     que fazer

     a vontade

     do meu Pai.

ELES NÃO

ENTENDERAM

AS PALAVRAS

QUE LHES

DISSE.

 

  • A importância do respeito

    Sempre foi um problema descobrir como saber se, na vida concreta do dia a dia, se cumpre a vontade de Deus. A resposta da Bíblia parece simples, já a partir do AT. A primeira leitura escolhida para este dia é esclarecedora a esse respeito. O autor do livro de Be-Sirá ou Sirácide (também conhecido por livro do Eclesiástico), que escreve a sua obra nos inícios do século II a.C., é extremamente actual e prática na forma como enfrenta a questão.  

    Não me parece que seja preocupação desse autor desenvolver um tratado teológico. Não era essa ideia. O que interessava, isso sim, era dar às pessoas, através duma espécie de manual de ensinamentos concretos, uma pista de como devem pôr em prática a vontade de Deus no seu dia a dia. A passagem escolhida para a festa da Sagrada Família naturalmente tem a ver com a vida em família. E, concretamente, visa estabelecer alguns princípios que devem reger os deveres dos filhos para com os pais e vice-versa. A palavra que resume o relacionamento dos filhos para com os pais, é, podemos dizê-lo, a palavra «respeito». O respeito não é sinónimo de temor e muito menos de terror, antes pelo contrário, na medida em que, na verdade e bem vistas as coisas, no fundo, o respeito não é possível senão em relação a quem se ama.

    Nessa vertente, trata-se dum texto que continua bastante actual. A família como célula básica da sociedade - hoje em dia talvez mais do que nunca - é objecto das mais diversas investidas de esboroamento, havendo até quem defenda que a destruição da instituição familiar seria a melhor forma de transformar a sociedade para melhor. Que, no âmbito das relações familiares, haja «usos e costumes» completamente ultrapassados, não discuto. Também a família é uma «célula» viva e, por isso, está sujeita a mudanças. Mas, nem oito nem oitenta. Parece-me superficial demais acabar pura e simplesmente com a instituição familiar como tal para os problemas ficarem resolvidos. Essa falta de respeito pela família começa pela tentativa levada a cabo, sobretudo na sociedade actual, por relativizar tudo, a começar pelo valor da vida, pondo em causa o princípio de que Deus é Deus dos vivos e dos mortos.

  • Quarto Mandamento actualizado

    Não sei até que ponto as razões aduzidas pelo autor do livro do Eclesiástico serão aceites na sociedade actual, mas a sua «tese» parece-me ainda válida. A pessoa como tal é herdeira de toda uma experiência acumulada ao longo dos anos e não se pode pretender recomeçar tudo de novo, como se ela devesse construir o seu presente e o seu futuro sem a «interferência» de ninguém (o passado). Parece que há sempre quem seja capaz de descobrir a pólvora, deitando para o lixo todas as aquisições que foram sendo alcançadas ao longo da história. «Honrar pai e mãe» continua a ser uma preposição válida hoje, como o era no século II antes de Cristo. Como continua a ser válida também a preposição de que é necessária respeitar seja quem for, desde o princípio da sua existência até ao fim natural desta mesma existência.

 

   Os laços relacionais modificaram-se certamente (e não apenas com retrocessos, mas também com alguns progressos), mas a necessidade dum ambiente propício ao crescimento e equilíbrio da pessoa humana continua a ser um facto. O respeito pelos pais poderá não ser a garantia de mais anos de vida (e esta é apenas uma expressão), mas é certamente a garantia de que esse respeito significa uma maior protecção e segurança. Por seu lado, os pais, para merecerem o respeito dos filhos, têm que nunca se esquecer que os primeiros a respeitar os direitos dos filhos são os pais. Nem sequer precisamos de ser peritos em psicologia para nos darmos conta de que da harmonia familiar depende a personalidade equilibrada dos seus membros. Sendo assim, o Quarto Mandamento continua a ser um marco importante para indicar o caminho que leva a um são equilíbrio de crescimento e auto-realização.

  • A paciência: virtude familiar

    A nível de família, verifica-se talvez um fenómeno que é constatável também a nível de sociedade em geral. Não sei se será pessimismo exagerado da minha parte, mas, às vezes, dá a impressão que, aos direitos que todos reclamam, não há a contraposição de deveres que a satisfação desses direitos supõe e requer. E o raciocínio é tão simples que até pode parecer redundante: se eu tenho direitos, então é lógico que terá que haver alguém obrigado a ir ao encontro deles.

 

A relação de forças entre direitos e deveres é, pois, uma constatação em todo o tipo de relacionamento. O caso da família não é nenhuma excepção a essa regra. E disse «relação de forças» de propósito, porque existe sempre um certo conflito que é preciso saber superar.

 

Talvez seja por isso que S. Paulo, escrevendo aos cristãos de Colossos, para além dos sentimentos de bondade, misericórdia e mansidão, recomenda também a paciência (cf. Cl 3,12) como virtude fundamental para o bom relacionamento entre as pessoas. Para que não haja dúvidas na mente de ninguém, Paulo acrescenta logo a seguir com palavras cruas: «Suportai-vos (sic) uns aos outros, perdoando-vos mutuamente, se alguém tiver razão de queixa contra outro» (Cl 3,13).  

    Nas relações interpessoais (e isso é notório no ambiente familiar) é preciso partir dum princípio muito simples para que as coisas corram bem: todos os membros que compõem essa célula relacional têm as suas virtudes e os seus defeitos. E, se até para suportar certas «virtudes», é precisa uma grande dose de paciência, muita mais será necessária para suportar os defeitos. E, neste caso, o que eu nunca posso esquecer é o seguinte: não são só os outros que têm defeitos. Também eu os tenho e talvez não sejam nem menores nem menos difíceis de «aturar» que os defeitos dos outros.

OUTROS TEMAS POSSÍVEIS:

  • Acima de tudo, a caridade

  • Discriminação entre homens e mulheres

  • Trabalhar para projecto comum

  • A obediência finalizada para Deus

  • Evitar obstáculos desnecessários

  • O que ficou foi a unidade