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Os amigos de Jesus tinham fugido todos quando ele foi preso. E, durante o processo em que ele foi condenado à morte, ninguém o acompanhou, com excepção provavelmente de João e Pedro. Mas este último, perante umas perguntas indiscretas dumas criadas e duns soldados do palácio do governador Pilatos, tinha negado covardemente, e por três vezes, que conhecesse Jesus...
Seja como for, o terem andado com Jesus durante três anos, não foi totalmente indiferente. A amizade entre eles tinha criado raízes. A morte do Mestre tinha-os deixado desolados e tristes. Mas, talvez por isso mesmo, procuraram reunir-se para falar sobre o que tinha acontecido; e provavelmente também para deitar contas à vida. E assim, embora desiludidos, reuniram-se em casa dum deles. Mas não tinham muita vontade de falar. E isso era compreensível, porque tudo tinha ido por água abaixo...
Estavam a atravessar um período em que não lhes apetecia fazer nada. Sentiam um vazio tremendo no coração. Mas, por outro lado, não podiam persistir naquele estado. Isso não era vida nem era nada. E, por isso, pouco a pouco, tinham que chegar a alguma conclusão; como, por exemplo, a de que estarem ali assim sem fazer nada, também não era solução nenhuma. O melhor, se calhar, o melhor era mesmo voltarem para suas casas e recomeçarem as suas antigas actividades.
Quando eles estavam a discutir como é que haviam de voltar ao trabalho, eis que, de repente, alguém empurra a porta. Era Maria Madalena, que vinha acompanhada por uma outra mulher, chamada Joana. Mais atrás, vinha a mãe de Tiago. Eram do grupo das senhoras que tinham acompanhado Jesus e os seus amigos. Acabavam de chegar ofegantes. Estavam muito agitadas. Tinham vindo a olhar para todos os lados para ver se não eram seguidas por ninguém...
Já dentro de casa, as mulheres começaram a cochichar, como se estivessem ainda com medo de que alguém as ouvisse. «Mas que foi, mulheres?» – gritou Simão Pedro – «Já chega de medos! Calma! Vamos lá ter calma! Sentem-se e contem-nos o que aconteceu?». Elas sentaram-se e, antes de começarem a falar, ainda quiseram certificar-se de que ninguém as tinha seguido...
Então Maria Madalena começou a contar: «Foi o seguinte. Ontem, nós nem sequer conseguimos dormir. Estávamos desesperadas e não sabíamos o que fazer. Aquela tarde de sexta-feira perturbou-nos por completo o coração. Quase sentimos remorsos por ele ter sido sepultado assim um pouco à pressa. Foi, por isso, que decidimos voltar hoje ao sepulcro para deixar tudo como deve ser; para colocar flores e para perfumar a mortalha. Tínhamos que fazer isso... senão não ficávamos descansadas»...
«Dirigimo-nos então para lá. Mas, ao chegarmos... que susto, santo Deus! A pedra que tapava a sepultura estava fora do lugar. E maior foi o susto quando verificámos que o sepulcro estava vazio. Só havia lá dentro uns panos e mais nada. Aí – continuou Maria Madalena – eu fiquei com raiva. Bem, mais que raiva, eu acho que era tristeza! E pensei para comigo: “Mas que desaforo! Não lhes bastava o que tinham feito para... roubarem também o corpo de Jesus!”. E ficámos todas cheias de medo!».
«Andávamos já dum lado para o outro, desesperadas, quando vimos ali uns homens, mesmo no jardim onde fica o lugar do sepulcro. Mas havia algo de estranho naqueles homens. Eu não sei explicar bem, mas era estranho!». Maria Madalena respirou fundo e continuou: «E então esses homens perguntaram-nos assim: “De quem andais à procura? Procurais o homem que estava ali no sepulcro? Não está lá! Porque é que chorais? Não resolve nada chorar”. E depois disseram-nos: “Mas esse Jesus não disse sempre que voltaria à vida depois de três dias?”.
Madalena não ficou descansada enquanto não deitou cá para fora tudo o que lhe ia na alma. E por isso disse ainda: «Esses homens que encontrámos no jardim disseram-nos ainda assim: “Não vale a pena procurar Jesus entre os mortos. Como pudestes verificar, não há ninguém no sepulcro. Deus é mais poderoso que os homens. E Deus libertou a Jesus da morte. Jesus ressuscitou. Jesus está vivo. Aliás, foi isso mesmo que ele disse antes de morrer”. Fomos então outra vez ao sepulcro para tirar dúvidas. E, de facto, não havia lá ninguém. Quando íamos voltar pelo mesmo caminho, já não encontrámos esses homens ali. Ficámos muito atrapalhadas...».
Maria Madalena respirou fundo mais uma vez e continuou: «Pareceu-nos tudo muito esquisito. Ao ouvir esses homens, por um lado, ficámos ainda mais tristes. Mas, por outro, aquelas palavras encheram-nos de paz e esperança. E, por isso, viemos logo para vos contar tudo!». «Ora, ora! Histórias!» – disparou logo Tomé – «Coisas de mulheres! Pode lá ser? Claro que o que aconteceu a Jesus foi uma coisa horrível, mas o caso é que ele morreu e, pronto, acabou-se. Ponto final!». «Mas acabou tudo mesmo?» – perguntou Alguém que acabara de entrar sem eles saberem como – «Então o que é que Jesus vos dizia sempre?»
Durante alguns instantes, reinou um silêncio total. Depois, todos começaram a falar ao mesmo tempo. Uns diziam que sim. Outros diziam que não. Uns recordavam que, de facto, Jesus tinha falado nisso e tinha dito que ressuscitaria ao terceiro dia. Outros não estavam lá muito convencidos. Até que Simão Pedro mandou parar aquela balbúrdia toda. Assim, não havia maneira de se entenderem. Assim, não havia maneira nenhuma de chegarem a qualquer conclusão...
Até que o homem que entrara em casa sem que eles soubessem como disse: «É realmente espantoso! Vocês são mesmo duros! Porque é que têm tanta dificuldade em acreditar no que está escrito? Reparai bem: então não vedes que sou eu mesmo?». Os discípulos ficaram atónitos. Literalmente, ficaram de boca aberta. E, quando caíram em si, já Jesus tinha abandonado o lugar... Então Tomé confidenciou aos outros: «Ah, como fomos estúpidos! Palavra de honra! Parece que estávamos cegos. De facto, não entendemos nada, porque não tínhamos fé suficiente. Afinal, é verdade. Jesus não está morto. Está vivo!». E a balbúrdia recomeçou. Foi preciso que Simão Pedro tomasse conta da situação, pois voltavam a não se entender...
Até que tomaram uma decisão. Saíram e foram ver para onde é que ele tinha ido. Foram atrás dele. Queriam ficar com ele, conversar com ele. Ainda o viram uma figura que lhes parecia a sua sair da cidade. Para onde iria? Tornariam a vê-lo. E, agora, o que é que iriam fazer? Teria sido ele mesmo ou não teriam tido uma alucinação? Mas seria possível que tudo acabasse assim?