1. A MORTE DUM INOCENTE
 

 

A prisão de Jesus é já só uma questão de horas. Um plano secreto está preparado até aos mínimos pormenores. Judas, um dos discípulos de Jesus, é o elo de ligação da equipe que vai pôr em prática esse plano. Tudo depende dele para o sucesso da operação. Quando Judas sai, quase no fim daquela última ceia, vai ter com os chefes dos sacerdotes para lhes revelar o paradeiro de Jesus. Ele sabia já que Jesus, depois da ceia, ia para o Jardim das Oliveiras...

 

Nada disto é uma surpresa para Jesus. Aliás, ele já tinha falado do assunto aos discípulos mais que uma vez. Até durante a última ceia lhes tinha dito que iriam acontecer coisas terríveis. Ele tinha perfeita consciência de que as suas palavras e atitudes indignavam e escandalizavam os chefes do povo e os sacerdotes do templo de Jerusalém. A sua influência sobre os pobres irrita os representantes da religião de Estado. Sabe que é constantemente vigiado e controlado por guardas especializados a mando dos sumos-sacerdotes.

 

A intriga está perfeitamente urdida. Precisamente como os chefes do povo tinham previsto. Agora Jesus irá comparecer, finalmente, perante os seus juízes. Os soldados do governador da cidade, ao sinal combinado por Judas, o traidor, vão ao Jardim das Oliveiras e prendem Jesus. Logo a seguir, conduzem-no para o pretório, que era uma espécie de tribunal dependente da autoridade dum pretor. Ali se reúne toda a corte.

 

Durante a espera, os guardas fazem pouco de Jesus. Despem-no ali diante de todos e depois cobrem-no com um manto vermelho e põem-lhe na cabeça uma coroa de espinhos. Depois, batendo-lhe, perguntam-lhe: «Vá, adivinha quem te bateu?». É insultado. É maltratado e não abre a boca. É como um cordeiro levado ao matadouro. É como ovelha nas mãos do tosquiador. Não se defende. É levado dum lado para o outro sem respeito. Ninguém parece ter compaixão pela sua situação...

 

Entretanto, desponta um novo dia. Os chefes do povo, os sumos-sacerdotes e os doutores da Lei reúnem-se para ver qual a sanção que lhe devem aplicar. Levam-no, finalmente, ao tribunal. O Sumo-sacerdote interroga Jesus sobre os seus discípulos e sobre os seus ensinamentos. Ao que Jesus se limita a responder: «Sempre falei abertamente a todos com clareza. Ensinei nas casas de oração, no templo e em público, onde quer que os judeus costumam reunir-se. Nunca disse nada em segredo. Porque fazeis estas perguntas? Perguntai àqueles que me ouviram. Eles sabem muito bem o que eu disse!». Perante uma resposta assim, um dos guardas dá-lhe uma bofetada: «Então é assim que respondes ao Sumo-sacerdote?». «Se falei mal, diz-me em quê. Mas se não, porque me bates?» – disse Jesus ao soldado. Mas ninguém responde a Jesus.

 

Todo o conselho procura uma culpa na vida de Jesus para lhe dar a morte. Mas, por muito que procurem, não a encontram. Muitos apresentam-se para dar falsos testemunhos, mas não conseguem pôr-se de acordo. Até que um se aproxima com uma nova acusação: «Ouvimo-lo dizer uma vez: destruí este templo feito pelos homens e reconstruí-lo-ei em três dias». Mas, nem quanto a isso, estão de acordo...

 

Então o Sumo-sacerdote, intrigado por ver que Jesus não responde a essas acusações, faz-lhe outra pergunta: «És tu o Messias, o Filho de Deus?». «Sim, sou eu mesmo!» – responde Jesus. Diante desta resposta, o Sumo-sacerdote rasga as vestes como sinal de indignação e pronuncia a sentença: «Não precisamos de ouvir mais testemunhas. Todos compreendestes muito bem que ele insultou a Deus. Não vos parece?». E todos corroboram essa sentença de morte. E então alguns começam a cuspir-lhe na cara. Depois, cobrem-lhe o rosto com um véu e dão-lhe mais bofetadas. Finalmente, ligam-no e levam-no dali para o entregarem a Pilatos, que era o governador romano da cidade.

 

Pedro segue tudo de longe, sentado no pátio. Uma criada aproxima-se e diz-lhe: «Tu não és um dos que andavam com esse galileu?!». Ele, cheio de medo, nega tudo: «Ó mulher, deves estar enganada. Nem sequer sei o que se passa. O que é que está para aí a dizer?». E, visto que o lugar não era seguro, Pedro dirige-se para a porta. Só que encontra uma outra criada que diz em voz alta para todos: «Ah, este também é dos dele!». Mas Pedro nega novamente e com juramento: «Juro-vos que nem sequer conheço esse homem!».

 

Infelizmente, encontra-se logo depois com um grupo de soldados que lhe fazem a mesma acusação. Pedro então começa a dizer imprecações e a jurar. Nesse mesmo momento, ouve-se cantar um galo. Pedro então lembra-se logo das palavras que Jesus lhe tinha dito: «Antes de o galo cantar, vais-me negar três vezes». Sai então desesperado daquele local e chora amargamente a sua covardia.

 

Entretanto, Jesus é levado à presença do governador Pilatos que o interroga: «Fazem várias acusações contra ti. O que é que tu dizes?». Mas Jesus não tem nada que dizer. Seja como for, o governador não vê nada de grave e não acha que ele represente qualquer perigo para a autoridade de Roma. Pouco depois, Pilatos então diz aos chefes do povo: «Acabo de o interrogar e não encontro nenhum motivo para o condenar». Agora tudo depende de Pilatos, mas Pilatos hesita.

 

Os chefes do povo procuram então convencer Pilatos. E, nestas coisas, todos os argumentos valem. E então dizem-lhe: «Nós não temos outro rei senão César. Esse Jesus confessou que era rei dos judeus. Ora, se o deixas ir em liberdade, tornas-te inimigo de César. Quem se proclama rei é contra César!». Acabam por acertar na tecla. É isso, perante a indecisão de Pilatos, não resta aos chefes senão uma solução politizar o problema...

 

E Pilatos cai na armadilha. Ele é responsável daquela região perante o imperador. Ora, certamente não vai permitir que aconteça uma subversão por causa dum judeu qualquer que ele nem sequer conhece. Mais um menos um, que lhe interessa? O que importa é assegurar a tranquilidade. E, assim, perante esta perspectiva, Pilatos já não tem dúvidas...

 

Pilatos manda então flagelar Jesus, pensando talvez que, depois, os chefes do povo já não insistissem tanto. Possivelmente Pilatos até está, de alguma forma, bem-intencionado. Quem sabe se não estará convencido que, vendo a Jesus daquela maneira, eles desistam mesmo de levar a sua até às últimas consequências! E então, depois de o mandar açoitar, Pilatos vem ao balcão do palácio e mostra-o à multidão dizendo: «Eis o Homem!». Mas a reacção é tudo menos o que ele esperava. A multidão, já acicatada pelos agitadores de praças, explode num grito unânime: «À morte! À morte! Crucifica-o! crucifica-o!». Pilatos então capitula e assina o decreto da sua condenação à morte.