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Depois de tudo o que tinha ocorrido na cidade onde morava Zaqueu, Jesus precisou de descansar. Dirigiu-se então, com os seus amigos, ainda nesse dia, para uma aldeia próxima da cidade. A ocasião foi-lhe oferecida quando conversava ainda com a gente na rua. Foi quando alguém lhe veio dar o seguinte recado: «A D. Marta mandou perguntar se não quer passar lá por casa dela para tomar qualquer coisa e descansar!»...
Todos conheciam bem essa senhora. Era uma mulher muito boa, que se matava a trabalhar e estava sempre disposta a ajudar os outros. Era de muita confiança. E era isso mesmo que quem trazia o recado estava a tentar dizer-lhe, desconhecendo talvez que Jesus a conhecesse. «Eu sei» – respondeu Jesus – «Eu sei bem que é! Já a conheço há bastante tempo. Bem como ao seu irmão e à outra irmã!». Pouco depois, Jesus saiu daquele local e dirigiu-se à aldeia mais próxima, que tinha o nome curioso de Betânia.
Mal ouviu barulho na rua, Marta veio logo a correr da cozinha. «Ainda bem que veio!» – disse logo – «Entre e sente-se, por favor». E, depois, dirigindo-se aos discípulos: «Acho que há aqui lugar para todos. Estejam à vontade!... Olhe, aqui está melhor. Está mais confortável! Desculpe, mas nem lhe posso dar a mão, porque está molhada. Posso oferecer-lhe alguma coisa. Um copo de água? Ou talvez um copo de vinho!? Estejam à vontade. Só lhes peço uma coisa: não reparem nesta confusão toda. É só por causa da minha irmã, que não liga nada a estas coisas. Mas, olhem, não se preocupem, estejam à vontade. E não dêem muita trela à minha irmã. O que ela quer é conversa. Bom, desculpem... só um momento. Tenho que ir ali à cozinha para dar uma olhadela ao que tenho no fogão!...».
A um canto da sala, onde Jesus se acomodou com os seus discípulos, estava uma moça. «Eu chamo-me Maria!» – começou ela por se apresentar a todos. «Ah, que nome bonito! A minha mãe também se chama Maria!», atalhou Jesus. «Pois é!» – respondeu ela – «Mas onde é que está a vantagem de ter um nome bonito»? «Onde é que está a vantagem?! Mas terá alguma desvantagem»? «Não sei» – suspirou ela – «Realmente, se quer que lhe diga, não sei!»... Entretanto, Marta voltou da cozinha: «Vim só trazer isto! É só um instante!». Trazia água e vinho! Ficou por ali ainda a arrumar umas coisas e a dar umas voltas. Depois voltou outra vez para a cozinha.
Entretanto, Jesus, dirigindo-se de novo a Maria, disse-lhe: «Então, não há mesmo nada que a menina tenha vontade de fazer»? «Não!», foi a resposta. «Há pessoas que sabem fazer tudo, que gostam de ajudar os outros. Nada lhes sai mal. Dão a sua vida pela família!». «Estás a falar da tua irmã?», atalhou Jesus. «Sim, estou mesmo a pensar na minha irmã. Ela, sim, sabe fazer tudo. Mas eu... sou diferente. Eu não sei fazer nada...».
Entretanto, chegou outra vez Marta: «Vá, pouca conversa! Comam mas é qualquer coisa, porque senão fica tudo frio e depois não presta!». Vinha como um pote de sopa fumegante. «Volto num instante!», foi dizendo, enquanto ia outra vez para a cozinha. «Ainda se esta minha irmã me ajudasse um pouco!»...
Jesus aproveitou então para esclarecer umas coisas: «Sabes, Maria! Há pessoas que pensam que sabem tudo. Sabem cozinhar bem, sabem arrumar muito bem a casa. Sabem como se comportar em todas as ocasiões. E não têm sequer tempo para se preocupar com outras coisas. Não têm tempo para pensar, por exemplo, na maneira de mudar um pouco as coisas, o mundo. A verdade é que há muitas coisas que estão mal. Quando fazemos alguma coisa para que haja mudança, então sentimos cá dentro uma satisfação enorme. E talvez sejamos capazes de descobrir que, afinal, embora não saibamos fazer muitas coisas, talvez saibamos e sejamos capazes de fazer outras!».
Logo depois, entrou novamente Marta com tigelas e pratos. Já não estava a gostar muito daquela conversa toda. E, a um dado momento, rebentou: «Pois é! Bem se vê quanto trabalho tenho eu aqui sozinha. A minha irmã só fica por aí sentada sem fazer nada. Isso de conversas, é uma desculpa. Uma moça deve é estar calada e cuidar da comida e das lides da casa. É isso que nos ensinam os nossos costumes e também os nossos antepassados. Oiça lá, não a poderia convencer o senhor para me vir ajudar um pouco? Ela a mim não me escuta. Talvez o senhor tenha mais sorte do que eu!». E Marta abalou novamente para a cozinha.
Quando Marta regressou com mais outro prato, Jesus disse-lhe: «Marta, é óptimo o que nos preparou. Está uma delícia. E, diga-se em abono da verdade, a gente até conversa melhor com o estômago acomodado. Eu sei que preparar a comida e arrumar a casa custa muito. Mas, se nem depois disso tudo, a gente tiver tempo para conversar um pouco, para conviver, então há algo que não está certo. Vá, descansa um pouco! Deixe lá o resto para depois! Vamos conversar todos um pouco. Vais ver que será melhor para ti e para a tua irmã. Ouve, já alguma vez pensaste em deixar durante uns dez minutos as panelas e ouvir o que a tua irmã tem dentro do coração? Experimenta e talvez tenhas surpresas»!
Marta notou uma certa seriedade e tristeza na voz de Jesus. Então, sim, tirou o avental e sentou-se. Conversaram durante muito tempo, até porque, no fundo, também Marta gostava de conversar. Com a sua irmã Maria, não sabia bem como havia de fazer, mas com outras pessoas até se entretinha de vez em quando...
Entretanto, os amigos de Jesus saíram para espairecer. O tempo estava bom e eles não eram pessoas para estarem muito tempo metidas em casa. Preferiam até dormir num palheiro ou num lugar assim qualquer. Então, Jesus foi falando de várias coisas de que, aliás já tinha falado com os seus discípulos várias vezes. «Ainda o outro dia lhes disse que é preciso pormos ordem na vida. Eu disse-lhes que o mais importante é ver qual é a vontade de Deus. Portanto, o comer e o beber não deve ser a nossa principal preocupação. Não estou a dizer que estas coisas não são importantes. Claro que são e muito. Mas temos é que descobrir qual é a finalidade da nossa vida, não te parece»?
Marta não respondeu, mas fez sinal que sim. E Jesus continuou: «Basta olhar para a natureza. Deus não deixa faltar nada às plantas, às árvores, às aves, a nada. Portanto, também não nos vai deixar faltar nada a nós. Agora, nós é que muitas vezes nos preocupamos demasiado. E, depois, há uma coisa, Marta. É que nem todos têm jeito para todas as coisas. A tua irmã, por exemplo, esteve a dizer-me que não sabe fazer nada das lides domésticas. Ora bem, talvez tenha que ser ajudada a descobrir uma nova maneira de fazer a vontade de Deus. Tu estás contente porque gostas do que fazes. Mas a Maria não está satisfeita. O seu coração anda à procura de outras formas de se realizar. Talvez nós tenhamos a obrigação de ajudar. Até porque lá diz o ditado: «O nosso coração está onde está aquilo de que gostamos!».