1. O GRÃO DE MOSTARDA
 

 

Foi numa tarde, já a Primavera ia a meio. Jesus e os discípulos deslocavam-se duma aldeia para outra. Pelo caminho, aproveitavam para apreciar a paisagem. Iam reparando no bulício dos campos. De quando em vez, Jesus conversava a sós com Pedro. Tinha coisas importantes a dizer-lhe. Estava a pensar em Pedro para ser o chefe duma comunidade especial que queria fundar. E, por isso, tinha que lhe dar algumas indicações a esse respeito...

 

Ao longo do caminho, Pedro perguntou assim a Jesus:

«O que é que vai ser de nós, afinal? Somos tão poucos! Somos apenas um punhado de homens! Só doze. Tu dizes que é necessário que toda a gente venha a conhecer-te, mesmo fora da nossa terra. Suponho que te referes às terras que pertencem aos romanos e a todos os outros povos. Isso até o compreendo. Mas como é que vamos fazer se somos tão poucos? Por outro lado – e digo-te isto sem rodeios – há por aí muita gente que acha pouca graça a tudo aquilo em que nós acreditamos. Como é que a gente vai fazer para os convencer»?

 

Jesus deixou que Pedro falasse à vontade. E Pedro, nessa tarde, desabafou o que lhe ia lá por dentro há muito tempo:

«Enquanto tu estiveres connosco, a coisa ainda vai, porque tu sabes fazer coisas prodigiosas. Mas o pior vai ser depois!».

Então Jesus, como quem não quer a coisa, aproximou-se dum muro, apanhou qualquer coisa e disse a Pedro: «Repara nisto que tenho aqui na palma da mão. Aqui! Não estás a ver? Então, não vês este ponto bem pequenino, preto. É isso! É a semente duma planta. É um grão de mostarda. Como tu sabes, é dos mais pequeninos que há. Ainda é mais pequeno que uma semente de couve... Agora, olha para aquele muro, além em frente! Que achas? Esse muro é ou não muito mais resistente que uma pequena semente de mostarda?». «Claro que é! Onde está a dúvida?!» – respondeu Pedro sem pestanejar.

 

«Ora bem» – continuou Jesus a dizer a Pedro – «o vento leva o grão de mostarda dum lado para o outro. A um dado momento, uma das sementes voa para aquele muro que estás a ver além. Deixa-me dizer-te que, por acaso, aquele muro até é a muralha duma fortaleza. O que é que acontece? Cai em cima da muralha. Os soldados da fortaleza nem sequer reparam nele. Eles treinam-se para a luta, marcham, andam por ali, mas não notam nada. Entretanto, a semente não perde tempo: brota e cresce, primeiro como uma erva, mas depois, pouco a pouco, vai-se tornando uma pequena planta. As suas raízes infiltram-se pela muralha e a muralha pouco a pouco começa a rachar...».

 

«Até parece impossível, mas é isso que acontece. E a planta torna-se uma pequena árvore e dá os seus frutos próprios. Desses frutos depois caem outras sementes e as pequenas plantas começam a espalhar-se pela muralha toda. Com o tempo, vão aparecendo fendas cada vez maiores. Ali, com a chuva e com o vento, vai-se juntando mais terra. No fim, a fortaleza acaba por desabar. E tudo por causa das plantas que crescem em cima das muralhas. E então acabam por sair de lá os soldados e aparecem os pássaros a fazer ninhos no meio daquelas plantas. Sucede o mesmo com as ervas daninhas: primeiro parecem tão pequenas que ninguém repara nelas. Mas, depois tornam-se tão fortes que até as muralhas acabam por ceder».

 

Pedro estava quase a adivinhar onde é que Jesus queria chegar, mas não interrompeu o Mestre. O Mestre sabia contar estas coisas com tanto jeito que até ele, que era um sujeito pouco dado a poesias, gostava. «Pois bem» – continuou Jesus – «isto tudo faz-nos pensar. Aliás, tudo na vida nos deve fazer pensar. Olha, Pedro, a nossa fé é assim como uma semente de mostarda...». E, ao dizer isto, Jesus calou-se uns instantes para ver qualquer era a reacção de Pedro...

 

Depois continuou: «Nós já vivemos, juntos, muitas experiências boas. Mas tu perguntaste-me como é que será depois?! Olha, Pedro, eu não to vou dizer por agora. Só te digo uma coisa. Estou a pensar em mandar-vos fazer uma experiência sozinhos. É isso. Vamo-nos separar por algum tempo. Vós ireis viajar sozinhos. Vamos ver se isso vos faz bem. É que eu quero que tenham uma experiência assim. Isso vai ajudar-vos a entender uma série de coisas que ainda tenho para vos dizer. Penso que ireis compreender melhor depois duma experiência deste género».

 

Alguns dias depois, conforme combinado, Jesus mandou os seus amigos dois a dois a fazer uma experiência. Nessa altura, foi-lhes dizendo: «Não vos preocupeis muito com o que levais. O importante é falar com as pessoas, sobretudo as mais pobres e que mais precisarem. Ireis ter algumas dificuldades, mas isso é perfeitamente normal. Qualquer iniciativa tem as suas dificuldades e os seus riscos. É preciso aceitar isso com naturalidade e maturidade. De todas as formas, acho que essa experiência vai ser boa. Irá ajudar-vos a saber como deveis proceder depois...».

 

E Jesus continuou: «Haveis de encontrar pessoas que vos aceitam e recebem bem; e outras que vos recebem mal. Não vos deveis admirar disso. Aceitai o bem que vos fizerem, mas não façais nenhuma tragédia só por haver alguém que não vos recebe ou inclusivamente vos trata mal. Neste último caso, o que tendes a fazer é ir para outro lado. Não há mais nada a fazer. Se, nalgum lugar, não vos quiserem ouvir, paciência! Aceitai isso com galhardia. Ide para outra localidade».

 

A experiência dos apóstolos era tão importante para Jesus que continuou a insistir: «Estou com uma certa curiosidade em saber como é que vos ireis sair neste trabalho! Isto é só um começo. Mas lembrai-vos duma coisa. Lembrai-vos da pequena semente de mostarda. Ao início, é muito pequenina, tão pequena que nem se vê. Mas depois transforma-se num arbusto bastante grande. Tão grande que até os pássaros se podem abrigar e construir os seus ninhos nos seus ramos»...

 

«Antes de partirdes» – concluiu Jesus – «ainda vos quero dizer mais uma coisa. Não espereis grandes resultados desta vossa experiência; desta vossa missão por essas terras. No entanto, ide confiantes. É evidente que nem tudo vai correr bem. A mim também não me correm bem todas as coisas. Vós chamais-me Mestre e tendes razão. Agora, não queirais então ser mais que o Mestre. Se as coisas não correm todas bem ao Mestre, não tenhais a pretensão de que a vós vos vão correr todas bem, porque não vão...»

 

«Agora, ficai cientes duma coisa: o meu Pai, que é o Deus em quem vós acreditais, quer-vos bem; tão bem que... (como é que hei-de dizer?), tão bem que, se Ele não quiser, nem sequer um cabelo cai da vossa cabeça. Agora, o que interessa é que deis testemunho de mim e do meu Pai. Assim podeis Ter a certeza de que o Reino do meu Pai será também vosso. Repito: tereis dificuldades, mas não desanimeis, porque o Pai sabe muito bem o que fazeis. E uma coisa é certa: tudo o que fizerdes em meu nome não ficará sem recompensa. Nem que se trata apenas de dar um copo de água fresca a quem tem sede. Ide! Ide e... bom trabalho!».