1. UMA MORTA-VIVA

 

Seriam cerca das quatro e meia da tarde quando Jesus e os seus amigos tomaram o barco para atravessar o lago de Genesaré.

Antes deles, já outros tinham partido. Tinham ouvido dizer que Jesus tinha intenção de ir para a outra margem do lago e então foram à frente. Queriam contar a toda a gente da aldeia do outro lado que Ele tinha feito uma coisa espantosa; que tinha expulsado uma data de demónios do corpo dum homem que metia medo a toda a gente. Agora o homem estava bem. E, como prova, eles tinham levado o homem consigo...

 

Depois de cerca de uma hora e meia de viagem, Jesus e os apóstolos chegaram finalmente à outra margem do lago. Jesus tinha intenção de dizer lá umas coisas, passar a noite e depois seguir viagem para outras aldeias e lugares. Acontece que, nessa aldeia, num pequeno quarto duma casa pobre, vivia uma menina duns doze anos que estava às portas da morte. Ninguém sabia explicar aquela doença. As pessoas, ao terem a notícia de que Jesus e os seus amigos estavam a amarrar o barco na praia, acorreram logo. Já todos sabiam o que se tinha passado do outro lado do lago. Ninguém queria perder a oportunidade de o poder conhecer pessoalmente. Todos lhe queriam tocar. Mas, intimamente, nutriam a secreta esperança de ver se Ele fazia também ali algo de extraordinário...

 

Entre aquelas pessoas todas, havia também um homem chamado Jairo. Na aldeia todos o conheciam. O que era normal, porque era um dos chefes da sinagoga. E a menina que estava a morrer era filha dele.

Tomando coragem, ele aproximou-se de Jesus e disse-lhe: «Senhor, pelo que tenho ouvido dizer, tu és capaz de tudo. Ouvi dizer que expulsas demónios e até que ressuscitas os mortos. Pois bem! Tenho lá em casa uma filha que está quase a morrer. Vem comigo e impõe-lhe as mãos, para que não morra».

Vendo que aquele homem tinha uma fé genuína, Jesus disse-lhe: «Vamos lá então a tua casa!».

 

Atrás dele, foram todos os que ali estavam. Pelo caminho, seguia também uma viúva que sofria de hemorragia e que tinha gasto todas as suas economias com médicos. Meteu-se entre todos e, por trás, tocou no manto de Jesus, pensando assim: «Se lhe tocar, nem que seja só na orla do seu manto, vou ficar curada!».

E, de facto, no mesmo instante, ficou curada... Jesus notou que alguém lhe tinha tocado. Virou-se então para trás e perguntou quem lhe tinha tocado.

Os discípulos, naturalmente, procuraram dar-lhe a explicação mais óbvia: «Então não vês que a gente é tanta? Somos apertados por todos os lados! Vá agora lá a gente saber quem te tocou!».

Mas Jesus continuou a olhar. Então a mulher que tinha sido curada, cheia de medo, aproximou-se e disse-lhe toda a verdade.

 

Ainda mal isto tinha sucedido e logo alguém veio a correr e a gritar:

«Olhe, meu amo, não vale a pena insistir. É tarde demais. Já não há nada a fazer. É melhor não incomodar mais o Mestre. A menina acaba de morrer!».

«O quê, não vale a pena? Quem é que disse que não vale a pena?» – interrompeu Jesus – «Tu, Jairo, também achas que não vale a pena? Pois eu digo-te: vale sempre a pena. Não tenhas receio. O que te peço é que acredites. Mais nada».

«Não é que eu não acredite» – respondeu o pai da menina – «mas agora já está morta. O que é que se pode fazer?».

«Bem» – insiste Jesus – «seja como for, vamos até à tua casa». E dirigiu-se prontamente para lá. Atrás dele foi toda a gente. Mas ele avisou logo:

«Não, assim não! Não quero ninguém lá em casa».

 

E Jesus só deixou entrar Pedro, Tiago e João, que eram dos mais íntimos dos seus discípulos. Chegados a casa do chefe da sinagoga, vieram ao seu encontro pessoas a chorar e a gritar.

Então ele disse-lhes: «Assim não! Não há motivo para chorar. Parem de chorar. A criança não morreu. Está a dormir!».

«A dormir?» – gritou alguém do meio da rua – «Isso deve ser uma piada! Está morta e bem morta. Tu não deves estar bom da cabeça!».

Jesus pôs fora aquela gente toda e entrou só com o pai e a mãe da menina e com os discípulos que o acompanhavam.

Então, tomando a menina pela mão, disse: «Menina, eu te ordeno, levanta-te!». E a menina levantou-se logo e começou a andar.

 

Naturalmente, todos os presentes que estavam à espera cá fora ficaram estupefactos quando Jesus veio cá para fora com a menina pela mão toda sorridente.

Os que tinham começado a gozar com o facto de Jesus ter dito que a menina não tido morrido começaram a ausentar-se cabisbaixos, por medo da reacção das outras pessoas.

Depois, Jesus disse ao pai e à mãe: «Aqui está a vossa filha! Não tendes nada para comer em casa? Ela deve estar cheia de fome».

 

Aparentemente, naquele dia, já não havia mais nada a fazer. Mas bem depressa se espalhou a notícia sobre este facto portentoso da ressurreição da menina. E, por isso, ainda ninguém se tinha retirado e já alguém lhe apresentava um surdo possesso dum demónio.

E Jesus atendeu o pedido. E, mal o demónio foi expulso, logo o mudo começou a falar.

A multidão, admirada, dizia: «Nunca se viu nada de semelhante nesta terra!».

 

Mas havia também ali gente mal-intencionada; sobretudo entre os fariseus, que tinham sempre qualquer outra explicação.

Desta vez, por exemplo, para impedir que Jesus fosse admirado demais, começaram logo ali a espalhar o rumor de que Jesus fazia essas curas porque estava combinado com o próprio demónio».

«Essa é boa!» – respondeu Jesus aos mais afoitos – «Mas isso é uma estupidez! Então já alguma vez viram alguém combater contra si mesmo? Se é com o poder do demónio que expulso os demónios, então estou a combater contra mim mesmo! Não sei que é que vos terá passado pela cabeça. Vós não me pareceis parvos, mas fazer um raciocínio desses... é estupidez demais!»

 

Mas Jesus não se ficou apenas pelo aspecto negativo. Ou seja, procurou também indicar um caminho de salvação, digamos assim.

Por isso, acrescentou, dirigindo-se ainda aos que o acusavam de actuar em nome do demónio (e, de resto, a todos os outros):

«Se não faço estas coisas pelo poder do demónio, mas sim pelo poder de Deus, então todos vós tendes que pensar bem nas consequências disso. Porque é que haveis de pensar sempre mal? E, então, se faço estas coisas pelo poder de Deus, porque é que não quereis, em vez disso, ouvir e acreditar em tudo o que tenho vindo a dizer em toda a parte?».

 

E Jesus aproveitou a oportunidade para dizer mais uma série de coisas.

Claro que tinha em mente dar uma resposta, de modo particular, aos fariseus. Mas também os seus discípulos precisavam de ouvir certas coisas, pois queria que eles tivessem ideias claras sobre a sua pessoa e a sua missão.

Podemos resumir em poucas palavras o que Ele terá dito nessa ocasião: «O Reino de Deus está próximo de vós! Quem me ouve a mim é ao meu Pai que ouve. E quem me rejeita a mim rejeita Aquele que me enviou. Portanto, vede bem como me julgais a mim»...