1. AS FLORES DO CAMPO
 

 

Como eu disse na conversa anterior, os amigos íntimos de Jesus eram doze.

Precisamente tantos quantas as tribos de Israel. Bom, já agora, para os mais curiosos, eu deixo aqui o nome deles: Simão, que também é conhecido por Pedro, e o seu irmão André; depois havia outros dois irmãos: Tiago e João; faziam parte do grupo também Filipe, Bartolomeu, Mateus e Tomé; havia ainda outro Tiago, que era filho de Alfeu, e também outro Simão, a quem chamavam o Zelota, por ser muito zeloso pela fé; e, finalmente, havia dois Judas: um era o Judas Tadeu e outro era Judas Iscariotes, que era o mais culto de todos e que foi, afinal, aquele que traiu a Jesus no fim da vida pública deste.

 

Passemos à frente. Um dia, passeavam pelos campos. Iam a conversar nas calmas. No meio do caminho, André deixou-se ficar um pouco para trás. Depois estugou o passo e logo alcançou os outros. Tinha ficado para trás para colher umas amoras. Um pouco mais à frente, os irmãos João e Tiago apanharam umas espigas e começaram a debulhar as espigas para as comer. Por seu lado, Filipe e Bartolomeu viram uma figueira e foram ver se ainda havia algum figo escondido entre as folhas. Mateus e Tomé encontraram umas uvas. Todos podiam provar. Todos se sentaram ao pé dum poço que havia ali perto.

 

Ali, à beira do poço, estava-se bem àquela hora do dia. Bom, o facto de eu estar a dizer as coisas desta maneira, não tira nada ao que toda a gente está farta de saber. Tudo isto eram pequenas coisas que ajudavam a formar – ou a formatar, como se diz agora – o grupo. E Jesus aproveitava sempre para ir dizendo umas coisas aos seus amigos.

 

Nesse dia, ao pé desse poço, Simão Pedro, que era bom conversador, perguntou a Jesus: «Olha, já há muito tempo que andamos para te perguntar isto. Pronto, não é tarde nem é cedo! Diz-nos lá! Não vai sendo tempo de nos ensinares o que devemos fazer quando tu fores rei de Israel»? Jesus limitou-se a sorrir. Mas Judas secundou a pergunta de Pedro: «Pois é isso mesmo! Vamos ter uma data de coisas a fazer. Não podemos esquecer nada para preparar a altura em que vais ser rei. Depois, temos também que arranjar dinheiro. Ora, para isso, temos de arranjar trabalho, comida e roupas». De dinheiro e estratégias Judas parecia saber bastante...

 

O sorriso bem depressa desapareceu do rosto de Jesus. Ficou mesmo triste com aquela conversa toda. É que os seus amigos estavam ainda muito apegados a uma ideia que Ele nunca lhes quisera incutir. E, por isso, com vagar (até porque o calor não convidava a grandes caminhadas), foi-lhes dizendo uma série de coisas importantes: «Quando é que vamos começar!? Mas... nós já começámos! Mas vós achais mesmo que temos que tratar dessas coisas todas de que tendes estado a falar? Não haverá coisas mais importantes que o comer e o beber? Não digo que isso não seja importante. Claro que é. Mas há coisas mais importantes que isso. Afinal de contas, a gente não vive para comer e para beber. Pensai bem nisto: se nós vivermos para comer e beber, que é que fazemos de especial que toda a gente não faça? Quando Eu vos chamei, era isso que tínheis em mente? Se é assim, estais enganados, porque não era isso que Eu tinha em mente...».

 

Os apóstolos (e Pedro em primeiro lugar) ficaram meio parvos, a olhar para Jesus. Não perceberam aonde é que Ele queria chegar. E talvez por isso mesmo Jesus continuou: «Durante a caminhada, não reparastes nas ervas e nas flores do campo? Bem, Eu não queria que interpretásseis mal o que vos digo. Mas temos que ter ideias muito claras sobre a vida. Vós já vistes por acaso uma flor pegar em si e ir por aí fora trabalhar? Ou então já vistes alguma flor diante do espelho a matar a cabeça porque não sabe como se arranjar? Claro que o que estou a dizer são imagens (sabeis isso bem!). Mas é simplesmente para vos dizer que as ervas e as flores se contentam com pouco: um pouco de terra, um pouco de chuva e sol. Enfim, contentam-se com aquilo que Deus lhes dá...»

 

Os apóstolos continuavam a não perceber patavina. E Jesus prosseguiu: «A conclusão que Eu quero tirar é a seguinte: cada ser neste mundo deve-se contentar com aquilo que deve ser. Por isso vos digo a vós: não vos preocupeis quanto à vossa vida, ou seja, com o que haveis de comer ou de beber ou com o que haveis de vestir!».

 

Os seus amigos olhavam para Jesus em proferir palavra. Então Ele continuou: «Olhai para as aves do céu. Nem semeiam nem ceifam nem recolhem em celeiros. No entanto, o Pai que está nos céus não lhes faz faltar nada. Claro que vós não sois nem flores nem pássaros, mas certamente podeis aprender com elas. As aves não se preocupam com nada, porque Deus cuida delas. Não é que não tenhais que fazer nada. Não é isso o que Eu quero dizer. O que quero dizer é o seguinte: Se Deus veste a erva do campo e as flores desta maneira, como é que não irá fazer muito mais por vós»?

 

Os amigos de Jesus continuavam a olhar para Ele com ar de admiração. Então Ele continuou: «Não me interpreteis mal. Certamente que é necessário trabalhar. Nós somos pessoas e temos que trabalhar. Mas o que vos quero dizer é que não podemos julgar que podemos resolver tudo com o nosso trabalho. Quer dizer, a nossa principal preocupação não pode ser só o que havemos de comer, beber e vestir. Certo, temos que pensar nisso, mas ai de nós se essa é a nossa única e principal preocupação...».

 

«Se assim pensais, então nem parece que andais comigo há já algum tempo. Os pagãos, esses sim, preocupam-se só com essas coisas, porque para eles não existe mais nada. Mas vós não podeis pensar assim. Vós sabeis que Deus até cuida das coisas mais insignificantes, como, por exemplo, até com os vossos cabelos. Portanto, Ele sabe muito bem do que precisais e não vos vai desiludir!...».

 

Essa vez, junto do poço, Jesus aproveitou bem a ocasião para bater na mesma tecla: o mais importante na vida não pode ser o comer e o beber. Isso é necessário, sem dúvida, mas não se pode fazer disso só a razão e a finalidade da nossa vida. Tudo isso é um meio e não um fim. E Cristo quis que essas coisas ficassem muito claras. Quando lhes tinha ensinado o «Pai Nosso», tinha-lhes dito que pedissem também «o pão-nosso de cada dia», mas disse-lhes também que era muito mais importante fazer a vontade de Deus...

 

Enfim, Jesus ensinou-lhes que não vale a pena fazer planos exclusivamente materiais: «Não junteis tesouros na terra, porque isso não passa de coisas efémeras. O que deveis fazer é acumular tesouros no céu, porque esses, sim, é que são imperecíveis. Vós acreditais em Deus, é verdade, mas, na prática, o que vos preocupa será Ele? O comer e o beber e o vestir e outras coisas materiais... tereis tempo de pensar nelas. São coisas necessárias, mas secundárias. Eu sei que nem toda a gente acredita no que acabo de vos dizer, mas vós já tínheis obrigação, mais do que os outros, de compreender estas coisas muito bem».