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O profeta Jonas é o exemplo típico da pessoa que está sempre em desacordo com os métodos de Deus. Quando Deus lhe diz para ir para Leste, ele vai para Oeste; quando Deus lhe diz para ir para Norte, ele vai para Sul. Mas a verdade é que, quando Deus quer uma coisa, há bem pouco a fazer. E, no caso de Jonas, acontece justamente isso também. Deus envia Jonas a Nínive e Jonas acaba mesmo por ir a Nínive. Mesmo que, para isso, tenha sido preciso ir procurá-lo por meio dum grande peixe que o lançou na praia...
Ir à grande cidade de Nínive não agradava mesmo nada a Jonas. Mas, pelo menos, havia uma coisa que lhe agradava: a mensagem que tinha que comunicar à sua população. Como sabemos, a sua missão tinha sido a de ir anunciar aos Ninivitas, que eram inimigos dos judeus, algo que lhe dava gozo: que todos iam morrer em breve. Ora, aí estava algo que fazia com gosto! Podemos mesmo imaginar Jonas a percorrer a cidade em todas as direcções esfregando as mãos de contente e a gritar: «Só faltam quarenta dias para a cidade de Nínive ser destruída!».
E, agora, Jonas está lá em cima no morro bem instalado. Nesse lugar, está fora de perigo. Além disso, daí pode ver toda a cidade e poderá gozar do espectáculo de ver destruir a cidade...Mas acontece algo de estranho enquanto Jonas está lá em cima à espera. Bem, para dizer a verdade, o estranho é que não acontece nada à cidade. Nínive converte-se a Deus e as predições de desgraças que ele tinha feito não se realizam. Não acontece nada como ele tinha previsto. Nada é destruído. A grande tragédia de que ele tinha falado não tinha acontecido...
Então Jonas, que era um sujeito impulsivo, zanga-se de verdade e protesta: «Mas, afinal, como é que é? Então... eu para aqui a fartar-me de dizer coisas e... nada?! Ora, ora, ó Deus! Contigo, é sempre a mesma coisa. Não se pode confiar em ti. Então eu disse o que disse e agora não acontece nada? Não, isto de ter confiança num Deus compreensivo e cheio de compaixão e que perdoa as culpas... não dá em nada! Eu cá tinha as minhas dúvidas de que tudo ia acabar mal para mim. Era por isso mesmo que eu não queria vir. Não, assim não pode ser. Hoje, diz que destrói tudo e, no outro, já não destrói coisa nenhuma? E agora, quem é o idiota desta história toda? Eu e mais ninguém. Pois olha, ó Deus, se é assim, não vale a pena viver. Deixa-me morrer aqui mesmo. É preferível morrer, a viver assim»...
Durante alguns momentos (que a Jonas pareceram horas), não se ouviu nada. Jonas quase que se assustou com as próprias palavras. E pôs uma cara de poucos amigos. Mas Deus não liga a estes truques. Ele sabe perfeitamente que as pessoas barafustam por tudo e por nada e querem sempre ter razão. E então, sem ligar nada ao que Jonas tinha dito, fez com que crescesse uma espécie de arbusto que lhe dava bastante sombra. Era um pouco para alegrar o pobre do Jonas. E aquela sombra era uma bênção, sobretudo numa altura em que o calor já começava a apertar...
Jonas achou tudo aquilo muito estranho. Como é que não tinha reparado antes que ali havia um arbusto? Tinha acabado de chegar e teria reparado! Já estava lá há muito tempo! Bom, de qualquer forma, largou durante alguns instantes aquela cara carrancuda e lá fez o favor de agradecer a Deus pela sombra que lhe tinha mandado.
Mas, durante a noite, não se sabe por que artes, veio um verme e roeu as raízes do arbusto, que murchou. Jonas perdeu logo o bom humor. De resto, não era preciso muito para ele perder a cabeça. «Olha, ó Deus, agora é que eu já não aguento mais. Faz mas é que eu morra e... pronto, acabou-se duma vez para sempre. Isto assim nem é vida nem é nada!». «Jonas (pareceu-lhe ouvir), tu julgas que tens razão, não é verdade? Acreditas mesmo nas patetices que estás a dizer?».
Houve um novo período de silêncio. Mas depois Deus disse: «Ouve lá, Jonas! Porque é que estás assim tão zangado? Só porque eu salvei a cidade? Mas, ouve lá, então, se eu te mandei a pregar a penitência, não era para a salvar? E a ti não te salvei também, e mais que uma vez? E a última foi bem divertida! Então tu achas que eu nunca deveria perdoar? Tu, por exemplo, tiveste a sorte daquela sombra e bem gostarias de ali ficar para sempre. Só porque o sol a queimou ficaste aborrecido. Então e eu... não tenho o direito de querer ficar também com Nínive...»?
Jonas coçava a careca. E Deus prosseguiu: «Então, Jonas, tu achas que Eu não podia nem devia fazer o que fiz? Tu gostavas de ficar com o teu arbusto, que te dava sombra, e que por acaso não era teu. Afinal, Jonas, qual é a tua missão? É mostrar que Eu sou o Deus de todos os homens, não é verdade? Até tu chegaste a dizer isso mesmo! E os outros profetas também o disseram! Ora bem, se Eu sou o Deus de todos os homens, então não haveria de ser também o Deus dos milhares de pessoas que moram em Nínive? Aliás, fica a saber uma coisa: não sou só Deus deles. Se sou Deus dum homenzinho como tu, Jonas, como não hei-de ser também o Deus de milhares de pessoas»?
Bom, amigo ouvinte, a história do profeta Jonas e da baleia (ou seja lá qual peixe for), se já alguma vez a ouviu, não foi assim. Eu contei-a doutra maneira. Mas acho que não me desviei da mensagem. O motivo por que uma história deste género causa tantos problemas é o facto de se partir dum falso princípio. Ou seja, parte-se do princípio de que o livro de Jonas é um livro histórico no sentido moderno do termo. Mas não é um livro histórico. Aliás, como sabem os que estão um pouco enfarinhados nestas coisas, é um livro que até está incluído nos livros proféticos e não históricos. O que já deve querer dizer alguma coisa! Jonas, portanto, pode ser o nome fictício duma história habilidosamente construída para nos mostrar que as nossas reacções instintivas nem sempre são as melhores...
Portanto, em poucas palavras, em relação ao livro de Jonas, a mensagem principal é a seguinte: demonstrar que os critérios de Deus são os que valem na avaliação do comportamento das pessoas. A maneira de raciocinar de Deus, se assim me posso expressar, não é igual à nossa maneira de raciocinar. Para Deus não há passado nem futuro, tudo é presente. E, por isso, nós não podemos julgar se as atitudes dele são justas ou não... Explico-me melhor. Quando Deus fala, Jonas (como, de resto, qualquer um de nós) faz o raciocínio seguinte: «O que Deus diz cumpre-se sempre. Ora, o pecado deve ser punido. Nínive pecou. Portanto, deve ser destruída. Se, porém, não foi destruída, então Deus é injusto, não cumpre a sua palavra». Agora, o mais interessante é que nem sequer a nós aplicamos sempre esse raciocínio no nosso agir. Ainda bem! Até nós estamos dispostos a dar às pessoas uma segunda ocasião ou até mais do que várias ocasiões. Isso é um facto!
Todos nós somos um pouco fariseus ao pensarmos assim: se Deus não castiga os maus (e os maus, claro, são sempre os outros), então gritamos logo por justiça. Mas quem somos nós para julgar a Deus? Concluindo, se quisermos, podemos dizer que a mensagem do livro de Jonas se resume numa simples frase: Deus é bom e a sua bondade não se mede pelos nossos critérios, mas sim pelos dele, porque Ele é o Senhor de todas as coisas e para ele tudo é presente.