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Noé levou imenso tempo a construir a sua arca. Mas, depois de terminada, parecia mesmo um navio. Já era mais alta que as árvores ao redor. Como é natural, as outras pessoas estranhavam tudo o que estavam a ver. Mas que brincadeira era aquela? Aquilo era uma estupidez de alto a baixo. Olha, agora... construir um navio no cimo duma colina! E logo daquele tamanho! Isso era mesmo de quem não tinha juízo nenhum! Ainda se fosse à beira da água, mas lá em cima da colina... não, aquele homem não tinha os parafusos todos!
Mas Noé não desistia. O que acontece, porém, é que as pessoas começavam a ficar intrigadas com aquilo: «Ora, ora! Vê-se mesmo que lhe deu a telha, coitado! Um navio deste tamanho aqui neste local? Isto é completamente inútil! Só se estivesse toda a vida a chover. Mas que estupidez»! Mas Noé pensava doutra maneira e dizia claramente às pessoas: «Vós chamais-me estúpido! Pois bem, eu acho que vos devíeis é preocupar. Um navio aqui em cima é, de facto estranho. Mas vós poderíeis tirar outra conclusão. Como, por exemplo, que algo de mau vai acontecer. E é que vai mesmo. Vamos então ver quem é que tem razão: se eu ou vós»! Mas as pessoas continuavam a não ligar nenhuma a Noé. Continuavam a levar a mesma vida leviana e injusta que não agradava a Deus...
Um dia, de repente, o tempo mudou por completo. Começaram a aparecer nuvens carregadas no horizonte. O sol desapareceu por completo. Ficou completamente escuro. Aí... começaram a cair as primeiras gotas. Não muito depois, desabou um temporal que nunca tinha sido visto. E a chuva engrossava cada vez mais. Todos se refugiaram nas suas tocas. Mas, não havia maneira de a chuva parar. Começaram a correr ribeiros pelas ruas e a água começou a entrar em casa. Daí a dois dias, os rios e os mares saíram dos seus leitos. Transbordavam para cima de tudo. A água começava já a bater contra as casas. Por todos os lados, só se via água, água e mais água. E subia cada vez mais. Subia até ao tecto, acabando por cobrir as casas. E as ondas começavam a subir pelas colinas...
A arca de Noé ainda estava lá no mesmo local do costume. Lá dentro, estavam Noé, a sua mulher, os seus filhos e os seus netos, bem como os animais. Estavam todos juntos uns dos outros. A atitude deles era uma atitude de espera. De repente, mugiu uma vaca, toda cheia de medo. No corredor, estavam um leão e uma leoa. Atrás deles, vieram uns ursos e por cima alguns macacos a saltar dum lugar para o outro...
De repente, o navio ou barco gemeu em todas as suas junturas. Eram dois enormes elefantes. Os filhos de Noé (Sem, Cam e Jafé), que eram fortes, levaram os animais para os lugares que lhes eram destinados. Até os burros tiveram que empurrar, porque estavam tão assustados que não conseguiam atinar com o estábulo. A água tinha subido ao redor do navio. A arca continuava a gemer e agora não eram os elefantes. A mulher de Noé chorava baixinho a um canto. Noé tentava acalmá-la. Nem sequer queria pensar no que estaria a acontecer às pessoas que tinham ficado lá fora...
A família de Noé ficou quarenta dias na arca. Durante esses quarenta dias, nunca deixou de chover. Mas a vida já se estava a tornar muito monótona. Não podiam sair. Estavam habituados a trabalhar e aquele tempo todo sem fazer nada já lhes estava a pesar. É claro que a bicharada a bordo ainda dava que fazer e todos ajudavam a tratar dos animais. E até as crianças gostavam muito de tratar de gatos e cães. Mas, quarenta dias já eram demais...
Um dia, quando estavam todos reunidos à volta da mesa, de repente, alguns caíram para trás e outros contra a mesa. Caíram também os copos de leite e rolaram sobre a mesa. A mulher de Noé já queria começar aos berros, porque julgava que o pessoal não se estava a portar bem, mas foi impedida por Noé que se tinha posto em pé e estava ali a rir-se a valer. Era a primeira vez que ele se ria depois de quarenta dias. «Foi o barco!» – gritou ele – «Foi o barco que poisou em terra firme». E, de repente, deram-se conta que, de facto, já não chovia. Todos correram para o andar de cima. Lá em cima, havia uma janela que deixava entrar luz. Mas até esse momento nunca tinham olhado sequer para ela. Abriram a janela devagar. A luz do sol invadiu tudo lá dentro...
Para tirar dúvidas, Noé largou uma pomba pela janela. Após algumas horas, a pomba voltou ofegante. Não tinha encontrado nenhum lugar onde pousar. Ainda estava tudo coberto de água. Uma semana mais tarde, a pomba foi solta outra vez. Voltou era já quase de noite. Fez uma bonita curva antes de ir para a janela. O miúdo que estava à janela disse logo para toda a gente: «Traz uma coisa no bico!». E, de facto, trazia no bico uma folhinha de oliveira. Era sinal de que tinha encontrado onde pousar. E, portanto, isso era também sinal de que a água tinha começado a baixar. Ficaram todos um pouco nervosos, mas foi nervosismo de contentamento. Dançaram pela primeira vez depois desse tempo todo.
Noé esperou mais sete dias. Depois soltou a pomba de novo, mas ela não voltou. Tinha encontrado lugar onde ficar. Então soltou outros pássaros. A terra começava a secar. Na manhã seguinte, Noé abriu a porta devagarinho. Tiveram todos que proteger os olhos por causa de tanto sol. Mas estavam contentes. Noé deu então ordens para abrir tudo e para porem toda a bicharada na rua. A vida tinha que continuar. Eles não podiam ficar ali sempre...
Ao saírem, um dos mais pequenos, apontando para o céu e dirigindo-se ao avô Noé, perguntou: «O que é aquilo»? Estavam a ver pela primeira vez o arco-íris. Então Noé, para dar uma satisfação ao neto, começou por dizer: «Olha, é uma espécie de ponte e tem um significado. Significa que Deus nos está a fazer uma promessa. Ele está a prometer-nos que nunca, nunca mais, vai permitir que aconteça uma coisa destas. Um dilúvio como este sobre a terra é uma coisa horrível. Olha, sempre que chover e depois fizer sol, haverá este sinal. Então saberemos que nunca mais haverá tanta água a separar Deus e os homens. Nunca mais, Deus e os homens estarão tão separados»...
Deram todos uns passos pelo terreno. Em algumas partes, havia ainda muito lodo. Olhavam uns para os outros sem saberem que fazer. Noé então teve a ideia de construir um altar ao Senhor. Tinham de oferecer a Deus um holocausto de agradecimento. Enquanto todos os outros tinham morrido afogados, eles tinham sido salvos. Era, pois, sua obrigação, agradecer a Deus esse facto maravilhoso...
Deus gostou desse gesto de Noé e da sua família e abençoou-os a todos. E, mais uma vez, repetiu a promessa que tinha feito aos primeiros homens: «Tereis poder sobre todos os animais. Tudo o que se move e tem vida vai servir-vos de alimento. Dou-vos tudo». E Noé e os seus filhos começaram de novo a trabalhar a terra, dando origem a povos de agricultores que estenderam a sua influência por toda a parte...