|
|
Vamos começar por partir do suposto que estamos três séculos após a existência de David. Israel nessa altura estava dividido em dois reinos: o do Norte, com a capital na Samaria, e o do Sul, com a capital em Jerusalém. Pois bem, nesse tempo, apareceu a Nordeste de Israel um outro povo que começou a dominar a região. O seu domínio estendia-se já a várias partes. Mais do que uma nação, era já um império. Tratava-se da Assíria.
Os soldados assírios eram fortes, resistentes e sobretudo tacticamente muito bem preparados. Como consequência, não tinham grandes dificuldades em tomar as terras por onde passavam. E houve uma altura em que se sentiam tão seguros que chegaram mesmo a pensar em invadir e conquistar o grande Egipto. Mas, para fazer isso, tinham que passar primeiro por outros países mais pequenos. No caso concreto, tinham que atravessar Damasco e os dois reinos de Israel.
Damasco e o reino do Norte de Israel também se consideravam relativamente fortes e capazes de resistir ao invasor assírio. Recusando-se, pois, a ceder à pretensão dos assírios, Damasco e Israel fizeram uma aliança. É verdade que estes dois reinos não se davam bem, mas, dadas as circunstâncias, não havia outra solução, porque ambos tinham um inimigo comum: a Assíria.
E, para que nada falhasse, houve que obter também o consentimento e aliança do reino do Sul de Israel, que se chamava Judá. O motivo era muito simples: se eles tivessem alguém a atacar por trás, então seria muito mais difícil resistir aos assírios. E, para que Judá colaborasse, não duvidaram em usar da chantagem: se Judá não aceitasse a aliança, então Damasco e Israel atacariam primeiro Judá e só depois avançariam contra a Assíria... O rei de Judá, que era Acaz, num primeiro tempo, ficou nervoso e começou logo a reforçar os muros da cidade de Jerusalém. Mas depois, pensando bem, disse para consigo: «Ah, Damasco e Israel querem-nos atacar?! Pois então eu é que lhes vou dizer como é! É isso mesmo! Vou mas é assinar um tratado de paz com a Assíria e, assim, já não somos nós que sofremos, mas sim Damasco e Israel!». Em todo o caso, Acaz quis primeiro ouvir os seus conselheiros. Um dos seus conselheiros era um senhor chamado Isaías. O rei chamou então os seus conselheiros e contou-lhes o plano em pormenor...
O geral dos conselheiros, como era seu costume, desfizeram-se em mesuras. Mas Isaías disse logo ali na cara ao rei: «Eu penso que esse plano é um plano sem pés nem cabeça. Eu acho que o nosso rei não se deve assustar com as ameaças dos reis de Damasco e Israel. Sabe porquê? Pois bem, vamos imaginar isto (só para nos entendermos): Damasco e Israel são como dois galhos de árvore. Acham que são mais fortes que o lenhador só por estarem juntos. O lenhador é a Assíria… Mas há mais. O plano não vai dar, porque Judá pretende tratar de igual para igual com a Assíria. Ora, isso não é verdade. O rei pensa que, apesar de fazermos um tratado, a Assíria não nos ataca? Está muito enganado. Acha que a Assíria, depois de tratar da saúde a Damasco e a Israel, vai deixar Judá intacto? Nem por sombras. Isso é uma utopia. A minha sugestão, portanto, é que não deve haver alianças nem com uns nem com o outro».
Acaz olhava para Isaías sem perceber lá muito bem onde ele queria chegar. Então Isaías prosseguiu: «A decisão que quer tomar não é a que melhor serve os interesses de Jerusalém. O reino de Judá é um reino pequeno e não tem necessidade nenhuma de fazer inimizade com ninguém. Para dar uma ajuda às pessoas, em vez de armas, acho bem melhor mandar fazer arados e charruas». O rei ficava impaciente: «Tu dizes que não me convém entrar em guerra, mas não podemos ficar indiferentes ao que se passa. Então o que é que se deve fazer? As palavras bonitas não resolvem nada»!
Isaías continuou então a desenvolver as suas ideias, correndo o risco de que o rei percebesse ainda menos. «O que eu digo é que o nosso rei, em vez de querer ir para a guerra, que é uma loucura, deve mas é confiar mais em Deus. Eu sei que vossa Majestade é um homem religioso. Ora bem, se acredita em Deus, sabe muito bem que, sem Ele, não se pode ir a parte nenhuma».
Interveio o rei Acaz: «Está bem, confiar em Deus! Mas, quais são as vantagens que isso nos traz? O quê... vamos agora ficar aqui à espera de braços cruzados, que aconteça algum milagre!?». «Bem» – responde-lhe Isaías – «vossa Majestade pode não acreditar, mas então o problema já é seu. Mas deixe-me que lhe diga o seguinte: Se nós não nos importamos com Deus, depois não devemos esperar que Ele se importe connosco! Mas, apesar de tudo, algo de extraordinário vai mesmo acontecer: uma jovem vai dar à luz e o filho dela vai ser rei». E Isaías desapareceu da presença do rei; e parece que para sempre...
Acaz subiu ao trono aos vinte e quatro anos. E, em vez de seguir as pegadas dos seus antepassados, fez alianças que arruinaram por completo o país. Mais do que isso, apostatou e deixou o Deus dos seus pais. E, mais, chegou mesmo a sacrificar os seus próprios filhos ao deus Baal. Isso foi um exemplo negativo para o seu povo que, a partir de então, começou a deixar-se guiar pelos usos e costumes pagãos. E, assim, o povo, pouco a pouco, foi perdendo a sua própria identidade. As pessoas chegaram a tal ponto que já nem sabiam bem quem eram e quem eram os seus antepassados... Devido a esses desvios e outros erros políticos, o rei de Judá acabou por cair nas mãos dos reis de Damasco e Israel.
Para se ver livre de Damasco e do Reino do Norte, e contrariamente ao que Isaías lhe dissera, Acaz fez uma aliança com o rei da Assíria, julgando que assim se veria livre para sempre da ameaça de Damasco e Israel. Mas a verdade é que o que lhe dissera o profeta Isaías, tudo se cumpriu à risca. De facto, depois de dominar os exércitos damasco e israelita, o rei da Assíria foi avançando para baixo. Destruiu Damasco e Israel, assassinando os dois reis e levando muitas pessoas prisioneiras para a Assíria. Os que ficavam não tinham que comer nem beber, porque o exército tinha deitado mão a tudo o que encontrava.
Bem depressa toda a população de Jerusalém soube do que tinha acontecido no Norte. E Isaías também. Só que os horrores ainda não tinham acabado. Depois de Damasco e da Samaria, ia chegar a vez de Jerusalém. O que era compreensível, porque as intenções da Assíria eram imperialistas. Quando chegou a altura, porém, Isaías não abandonou o seu povo. Ele tinha dito a verdade a todos, mas ninguém o tinha querido ouvir. Mas, agora, em consciência, tinha que ficar, para a todos infundir coragem. Estavam de tal maneira desesperados que, se não houvesse alguém que os animasse, não saberiam o que fazer...
Eis em resumo o que Isaías disse às pessoas nessa altura: «Virá um dia em que será bom viver de novo nesta cidade. As coisas agora estão feias. Mas isto vai mudar. Um dia ainda vamos ter paz. E não só nós, mas todos os povos vizinhos. Virão tempos em que não havemos de ver botas de soldados a pisar os nossos caminhos, a destruir e a saquear as nossas residências. Será como se tudo na natureza se pusesse em harmonia... É o que vos digo: tudo isto vai acontecer quando chegar o novo rei, o rei que há-de trazer a paz e a harmonia a toda a gente»...