1. DESAFIO NO MONTE
 

 

A seca em Israel já durava quase três anos. As más colheitas eram umas atrás das outras. As terras estavam gretadas por causa do sol e da falta de água. Os animais morriam aos milhares e os homens passavam fome. Então, Elias achou que já era altura de fazer alguma coisa, para levantar essa maldição de Deus. E começou a pensar em ir pedir ao rei uma audiência para falar do assunto. Por seu lado, e por coincidência, também o rei se levantou um dia mais mal-humorado e começou a berrar no palácio: «Vão-me à procura desse Elias. Tragam-mo cá. Se ainda não morreu, apesar da seca, é porque deve ter algo a ver com tudo isto!»...

 

Os pajens acorreram e também os cortesãos. O rei então continuou: «O que nós temos estado a sofrer pode muito bem ser por causa desse tal Elias. Agora me lembro de que, antes de partir, ele nos ameaçou com uma grande seca. Ele deve ter rogado alguma praga e é isto o que acontece. Tudo isto é culpa dele». E o rei encomendou a um homem temente a Deus, chamado Abdias, para que tratasse do assunto urgentemente. Por acaso, Abdias era amigo do profeta Elias e até o tinha ajudado a escapar, bem como a alguns dos discípulos de Elias.

 

Abdias partiu para se ir encontrar com Elias. Quando se encontraram, foi Elias o primeiro a falar do assunto, ou seja, do desejo que tinha de se encontrar com o rei Acab. Por receio, Abdias começou por não concordar com a sugestão. Mas, depois teve que ceder perante a insistência de Elias. Abdias contou, pois, ao rei, o que se tinha passado no seu encontro com o profeta.

 

O rei foi ao encontro do profeta que, entretanto, tinha deixado o seu esconderijo: «Ah, aí estás tu! Tu é que és o responsável por toda esta desgraça». «Ah, sim?!» – respondeu-lhe o profeta – «Já que fala do assunto, pois digo a Vossa Majestade que não tenho nada a ver com o que está a acontecer. O verdadeiro culpado, ao contrário, é o rei. Têm sido precisamente os que têm ocupado o trono de Israel que têm atraído sobre o nosso país estas desgraças todas. Se tivessem sido fiéis ao Senhor, nada disto teria acontecido».

 

O rei olhava para Elias sem dizer palavra. Então este tomou a palavra novamente: «Eu tenho uma proposta a fazer. Convoquem os quatrocentos e cinquenta sacerdotes do deus Baal para o monte Carmelo. E, já agora, podem ir também os quatrocentos profetas que comem à mesa de Jezabel. Sempre quero ver o que é que esse deus Baal pode fazer para nos tirar desta desgraça». «Está combinado!» – limitou-se a dizer o rei.

 

E dito e feito. Fez-se a propaganda necessária e possível, dadas as circunstâncias. E então dirigiu-se para o Carmelo uma grande multidão. Todos estavam curiosos por presenciar o embate. Sobretudo atendendo é que, de um lado, era só Elias e, do outro lado, todos os sacerdotes e profetas do deus Baal. Os sacerdotes chegaram todos numa procissão solene e ruidosa. O desafio consistia em porem num altar de pedra dois novilhos: um Elias e outro os sacerdotes de Baal, sem lhes atearem o fogo. Depois de invocar cada um o nome do seu Deus, aquele Deus que respondesse enviando fogo para consumir as carnes dos novilhos, esse seria reconhecido como único e verdadeiro Deus...

 

O povo, que gosta de espectáculo, aceitou o desafio com entusiasmo. «Mas não se esqueçam!» – insistiu Elias – «ninguém pode acender fogo algum. É isso que está combinado. Vós – gritou ele para os sacerdotes – não deveis ter nenhum receio. O vosso deus não é poderoso? Pois, se é assim, então bem pode mandar do céu fogo para devorar a vítima...».

 

Os sacerdotes do deus Baal começaram logo a rezar. Gritavam e berravam, pulavam e dançavam. Segundo todos os ritos e todas as regras. Deitavam-se por terra ou então rodopiavam em círculo. Gemiam palavras que ninguém entendia, batiam com os pés, faziam gestos mágicos, que eram incompreensíveis. E isto durante horas e horas a fio. Mas nada aconteceu. Elias mantinha-se calmo. Até se dava ao luxo de fazer troça: «Gritai mais alto. Talvez o vosso deus esteja entretido com algum assunto importante ou alguma viagem. Talvez esteja a dormir. Mais alto! Coragem. É uma coisa simples, não é? É só pedir ao vosso deus que envie uma chamazinha, mais nada!»...

 

Os espectadores riam com gosto. Aquilo era mesmo um espectáculo. Chegados ao pôr-do-sol, Elias pediu a atenção de todos: «Aproximem-se de mim. Ajudem-me a levantar o altar do Senhor. Vamos construi-lo com essas doze pedras que aí estão». Depois, mandou fazer um sulco profundo à roda do altar. Dispôs lenha em cima e colocou o bezerro partido aos pedaços. A seguir disse: «Para que ninguém duvide, agora peguem em quatro talhas de água e derramem-nas sobre o bezerro e a lenha». E, para tirar todas as dúvidas, repetiu aquele gesto mais duas vezes. Depois, prostrou-se por terra e disse: «Senhor, Deus de Israel, ouvi-me! Que este povo reconheça que Vós, Senhor sois quem converte os corações!».

 

Houve um silêncio quase sepulcral. E, de repente, desceu do céu o fogo que consumiu o holocausto, a lenha, as pedras, a poeira e até a água do sulco. Nesse momento, após a invocação do profeta, desceu fogo do céu e devorou toda a lenha e o bezerro. Todos se prostraram por terra e começaram a abraçar-se uns aos outros... A reacção das pessoas foi de tal ordem que todos começaram a louvar o Deus de Israel. E descobriram que, afinal de contas, estavam a ser enganados pelos sacerdotes de Baal. E não se ficaram por palavras. Passaram aos factos. De tal maneira que nenhum dos sacerdotes de Baal foi poupado.

 

E não tardou muito que as nuvens começassem a toldar o céu. E, bem depressa, caía sobre todo o território, a primeira chuva depois de três anos de seca. Apesar do milagre do monte Carmelo, as coisas, no entanto, não melhoraram muito. O rei Acab contou tudo à rainha Jezabel. E esta ficou ainda mais cruel do que antes. E tudo fez para que, a partir desse momento, Elias fosse liquidado o mais depressa possível. E, por isso, Elias teve que fugir de novo para o deserto. Na solidão do seu desalento, começou a pensar: «Não consegui nada. Nada mais me resta fazer. Fiz o melhor que pude e sofri muito. No entanto, esta gente continua a não ligar nada ao que lhes digo. Se é assim, meu Deus, é preferível morrer!»...

 

E Elias partiu e adentrou-se no deserto, até chegar ao Monte Horeb, onde Moisés, muitíssimos anos antes, tinha visto a Deus. Elias entrou numa caverna e esperou pelos acontecimentos. Caiu o temporal, grandes pedras rolaram pela encosta abaixo, o vento uivava lá ao longe. Mas não era Deus. Essas coisas tinham acontecido a Moisés, mas agora não. Depois disso, fez-se um silêncio de morte. E logo a seguir, começou a soprar uma brisa suave. Elias então compreendeu: «Deus está sempre connosco! e não importa muito se há apenas algumas pessoas que O respeitam. Deus continua com pouca gente nesta caminhada, mas mais gente virá... E, se há um profeta como eu, que não consegue fazer mais nada, outro virá a tomar o meu lugar. Se há reis que fazem o mal, vai chegar também um dia em que teremos um rei que será forte diante de Deus e que trará a paz para sempre...».