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Ao rei Salomão seguiram-se os seus descendentes. E, sensivelmente cem anos depois, as coisas começaram a ficar muito feias. A situação religiosa, social e sobretudo política de Israel estava muito pior do que na época dos reis David e Salomão. Mas a verdade é que tudo tinha começado com Salomão; sobretudo a partir do momento em que se deixou embalar pela fama. Não ligava nada ao que era importante: o governo do reino.
E, cem anos depois, o país está dividido e enfraquecido. As lutas internas são cada vez mais frequentes. As lutas de sucessão tinham produzido a ruptura do país em dois: um reino ao Sul, com a capital em Jerusalém e um outro reino ao Norte com a capital na cidade de Samaria. Os reis que governavam o Sul eram da descendência de Judá e por isso esse reino também se chamava de Judá. Daí também o adjectivo «judeu», que, a partir desse momento, começou a aplicar-se aos hebreus ou israelitas. Ao reino do Norte passou a chamar-se propriamente Reino de Israel, até porque, digamos assim, nele estavam representados todas as outras 11 tribos de Israel.
Este nome «Israel» deriva dum facto curioso. Como se sabe, o pai das doze tribos chamava-se Jacob. Ora, este, a partir dum certo momento da sua vida, em circunstâncias que não estou aqui a explicar, passou a chamar-se precisamente Israel. Daí chamar-se aos seus descendentes israelitas. E daí também que, ainda hoje, se usem os termos «hebreu», «judeu» e «israelita» com um significado muito parecido.
Hoje, gostaria de contar algo do que aconteceu a um dos reis desse reino do Norte. O nome do rei é Acab. Um nome como outro qualquer. Acab tinha casado com uma mulher muito rica. O que não é nada de extraordinário, pois ele era rei. O nome dela era Jezabel. Ela era natural do porto de Tiro. Sendo uma mulher cosmopolita, estava dentro de tudo o que era a última moda em todo o mundo de então. E, como era natural, então trouxe também consigo os costumes da sua terra. E também a sua religião. Ela não era israelita, mas de maneira nenhuma quis renunciar à sua religião e ao culto dos seus deuses.
O deus principal do país de onde ela provinha chamava-se Baal. Os sacerdotes desse deus usavam roupas luxuosas e ritos extravagantes. No fundo, eles seguiam uma religião natural. E pensavam mais ou menos assim: «Todos os frutos que crescem nas árvores, todo o trigo que cresce na terra, tudo é um grande milagre. Ora, isso tem que ter relação com Deus. Que de uma vaca nasça um bezerro e que a chuva fertilize a terra... tudo isso é também um milagre. Então, temos que adorar quem faz esses milagres».
Quanto a esses costumes, não havia grandes problemas. E que eles chamassem a Deus Baal também não era um problema. Agora, o que acontece é que não admitiam outras opiniões. E havia mais um princípio em que eram irredutíveis: o princípio da fertilidade da terra e da natureza. Daí tiravam a seguinte conclusão: se a fertilidade vem de Deus, o que não produz frutos não pode ser senão consequência do Maligno. E aplicavam também este princípio às pessoas. Sendo assim, uma mulher, para ser realmente uma mulher a cem por cento, tinha que ser fértil e ter filhos. Afinal, e segundo a mentalidade deles, a finalidade da mulher era precisamente essa...
Daí se tiravam outras conclusões. As mulheres jovens e fortes eram respeitadas e tidas mais em conta do que as mulheres fracas, doentes ou velhas. Pois só elas é que podiam ter filhos robustos e sadios para dar glória e honra a Baal. Eram coisas assim que os sacerdotes do deus Baal ensinavam. Ora, a rainha Jezabel estava encantada com essa religião. Por seu lado, o rei Acab não era lá grande rei; aliás, nem sequer grande homem. Melhor dizendo, era um homem fraco e de pouco carácter. Por isso, facilmente se deixava levar pelas ideias e pelos caprichos da rainha Jezabel.
Um dia, Jezabel convenceu o rei Acab a publicar um decreto segundo o qual todas a gente tinha que seguir a religião de Baal. E, portanto, a velha religião de Israel foi proibida. Só que uma coisa é decretar e outra bem diferente é pôr o decreto em prática. Ora bem, acontece que vivia nesse tempo em Israel um homem chamado Elias, que não era para brincadeiras. Ele não queria saber desse tal deus Baal para nada. Além disso, via perfeitamente que, mesmo no campo político, isso era muito perigoso para o país. Um país governado por pessoas como Jezabel e Acab acabaria por desaparecer do mapa como país independente...
Sem medo, Elias foi ter com Acab para lhe lançar em cara tudo o que pensava sobre a situação. Podemos resumir assim a sua audiência com o rei: «Sua Majestade, dando ouvidos à rainha, está a dar cabo da sua nação. Mas não julgue que vai conseguir o seu intento! Acha que Baal é que fecunda a terra com a chuva? E se a chuva vier a falar durante meses e anos a fio? Depois disso, só quero ver o que vai acontecer». Elias disse o que tinha a dizer e foi-se embora.
A rainha Jezabel chegou ainda a tempo de ouvir as últimas frases. E naturalmente ficou furiosa: «Mas então, afinal, quem é o rei aqui? O que tu devias fazer era cortar a cabeça a esse miserável atrevido. Mais: devias é pôr na cadeia toda essa gente que acredita em toda essa treta do Deus de Israel!». Acab concordou com a mulher e mandou chamar logo os carrascos e os soldados para executarem as sugestões de Jesabel. Nesse dia pereceram muitas pessoas por ordem do rei.
Mas a ideia mais específica da rainha era matar o profeta Elias, mas ele fugiu, embora alguns dos seus discípulos tenham sido passados ao fio da espada...Um amigo de Elias conseguiu escapar à chacina e esconder numas cavernas cerca de cem pessoas. Aí viveram alguns anos praticamente a pão e água. Entretanto, devido ao clima de terror que se tinha criado, muitos em Israel dobraram o joelho diante do deus Baal. Quanto a Elias, depois do que dissera ao rei Acaba, era o inimigo público número um do reino; e sobretudo o inimigo número um da rainha, que queria dominar sobre tudo...
Elias foi procurado durante vários meses, mas não o conseguiram encontrar. Acab nem percebia como é que conseguia sobreviver no deserto. De resto, a sua admiração ainda aumentou quando casualmente veio a saber que com ele viviam muitos mais onde nada crescia. Mas, por outro lado, pensou: «Para quê gastar dinheiro e energias? Eles no deserto não me podem fazer mal nenhum. Aliás... também não poderão sobreviver lá por muito tempo!». Mas o facto é que Elias e os seus sobreviviam. E o povo veio a saber que Elias tinha encontrado uma fonte para beber e que os pássaros lhe levavam pão e carne todos os dias. Quando a fonte secou, Elias viu-se obrigado a pedir auxílio a uma pobre viúva, que tinha só um filho. Ela não queria ajudá-lo ao princípio, porque o que tinha nem para o filho chegava. Mas, depois, lá aceitou, porque pensou que, com aquela seca toda, mais dia, menos dia, morreria ela e o filho e toda a gente. Por isso (pensava ela), mais dia, menos dia, tanto faz. Faço uma caridade a este homem e não se perde nada. E, quem sabe, talvez Deus acabe por nos abençoar por isso.