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Naquela viagem de Jerusalém para Damasco, tudo mudou na vida de Saulo. De repente, ele percebeu que o que estava escrito na Bíblia, afinal, não tinha o sentido que ele julgava. Quando se lê com mais cuidado e profundidade, a Bíblia revela-nos coisas em que nunca tínhamos pensado. E foi isso que o que aconteceu com Saulo. A capacidade de descobrir coisas novas na Bíblia não depende tanto da inteligência das pessoas como da abertura de coração ao que se está a ler...
Aquele queda do cavalo quando se aproximava de Damasco foi uma experiência única na vida de Saulo. Foi uma experiência tão intensa e tão única que Saulo mudou completamente de rumo. Com o tempo, a notícia do que lhe acontecera espalhou-se um pouco por toda a parte. E era uma notícia realmente sensacional: o mesmo Saulo, que tinha perseguido as comunidades que se reuniam em nome de Jesus de Nazaré, agora trabalhava juntamente com elas. Era algo de incrível!
Um dos primeiros a ouvir a notícia da transformação completa da atitude de Saulo foi um sujeito chamado Barnabé. Barnabé era um homem culto e vivia num ambiente onde era necessário ter gente com estudos. Então depressa se lembrou de enviar uma carta para Damasco. A carta apresentava as necessidades que se faziam sentir em Antioquia e pedia à comunidade de Damasco para mandarem Paulo para Antioquia...
Antioquia, naquela época, era uma grande cidade, com cerca de meio milhão de habitantes. Lá trabalhava uma grande comunidade de judeus que tinham construído as suas sinagogas. Vivendo fora de Israel, em contacto com outras pessoas e outra mentalidade, esses judeus mostravam-se mais abertos a novas ideias. E, por conseguinte, muitos deles estavam interessados em conhecer os novos ensinamentos de Jesus...
Barnabé tinha abandonado Jerusalém na altura em que os discípulos de Jesus começaram a ser perseguidos. No exterior, mais precisamente em Antioquia, tinha reunido um pequeno grupo de amigos. Com a ajuda deles, começou a trabalhar a sério no sentido de falar de Jesus nas sinagogas judaicas. Esta, portanto, realmente a precisar de alguém que o ajudasse nessa tarefa, que não era nada fácil...
Entretanto, e como resposta ao seu pedido, não muito depois, Saulo chegava a Antioquia. Barnabé foi ao seu encontro. Saulo ficaria a morar na sua casa. E, no dia a seguir à chegada de Paulo, que era sábado, lá foram à sinagoga. Barnabé já tinha dado a notícia e, nesse dia, o grupo era particularmente numeroso. Na sinagoga, as coisas passavam-se como sempre se tinham passado. Entoavam-se cânticos, faziam-se algumas leituras e, depois, seguiam-se comentários e orações tradicionais.
Nesse dia, na sinagoga, o mais velho do grupo levantou-se para ler. Leu um trecho tirado do Salmo 2 que dizia assim: «Cantarei por toda a parte os prodígios maravilhosos que Deus nos fez!». E, mais adiante, leu o seguinte: «Tu és o meu Filho, o Messias. Eu enviei-o ao mundo. Tu, homem, deves saber que todos os homens e todas as coisas Lhe pertencem!». Fez-se silêncio durante alguns instantes. Todos olhavam para Saulo. Era ele o desconhecido. Era ele a visita. E, embora não querendo, era também objecto de alguma desconfiança por parte dos discípulos de Jesus...
Depois, Barnabé convidou Saulo a dirigir-se à assembleia ali reunida. Entre os presentes, havia judeus que já pertenciam ao grupo dos discípulos de Jesus; e também gregos que estavam interessados em aprofundar essa nova religião. Saulo então levantou-se e começou por dizer: «Bom, antes de mais, eu gostaria de vos cumprimentar a todos. Vós estais a olhar para mim com cara de quem pensa: “Mas que difícil é esta passagem da Bíblia! O que significa falar dum homem tão bom que até lhe podemos chamar Filho de Deus? Como é que devemos imaginar esse homem? Pois bem, não penseis que eu sei mais do que vós. Não sei. Mas, para mim, é mais fácil compreender este trecho quando me lembro de Jesus. Então, sim, tudo me parece claro: Jesus é esse homem a quem podemos chamar Filho de Deus. E mais ainda: pensando em Jesus, entendo o que significa a palavra “Messias”»...
«Era isso mesmo o que eu gostaria de perguntar!» – interrompeu alguém do meio do grupo – «Quem é o Messias? O que é que quer dizer a palavra “Messias”?». Todos se voltaram para trás para ver quem é que tinha acabado de fazer a pergunta. «Que pergunta mais estúpida!» – pensavam alguns. Só podia vir dum desses gregos que não percebiam nada de nada. Mas também não era para admirar, pois há pouco tempo que vinham a estas reuniões.
Mas Saulo não se atrapalhou: «Pois bem! Boa pergunta. Como sabes, há muito tempo que os judeus conhecem o Deus de Israel. Foi o próprio Deus que formou esse povo. Então os judeus pensaram: “Agora que temos uma terra, temos que ter também um rei”. E veio um rei. Chamava-se Saul. Mas esse rei tinha mau coração. Então o que aconteceu? Aconteceu que foi escolhido um outro rei. David. Esse, sim, era um rei como Deus queria. E foi tão respeitado que as pessoas começaram a pensar que, um dia, viria um descendente dele que fosse ainda mais bondoso, justo, sincero e que defendesse os fracos, as viúvas, os órfãos, enfim, os mais necessitados... E esse era o Messias, o ungido de Deus por excelência. Pois bem, esse rei é Jesus de Nazaré»...
Muitos dos presentes, especialmente gregos, olhavam para Saulo com algum espanto. «Antigamente» – continuou Saulo – «quando alguém era coroado rei, fazia-se uma cerimónia muito grandiosa. O escolhido ou o descendente dum outro rei, era ungido com óleo precioso e com perfumes. Por isso se dizia que o rei era um «ungido». A esse ungido nós chamamos também Messias... E vós, irmãos gregos, como é que dizeis a palavra “ungido” e “Messias”?»... Saulo fez uma pausa e, olhando em seu redor e particularmente lá para o fundo, onde havia mais gregos, esperou por uma resposta. A resposta demorou ainda bastante tempo. Até que um, lá no fundo, lhe respondeu: «Na nossa língua, acho que podemos traduzir a ideia de “ungido” com a palavra “Xristo”». «Muito bem!» – atalhou Saulo – «Então, quando dizemos que Jesus é o Cristo, não estamos a dizer senão “Jesus Messias”. A conclusão, portanto, é fácil: Jesus é o ungido de Deus, o Messias de Deus»...
Para esse dia, o tema já chegava bem. Depois disso, conversa vai, conversa vem, Saulo acabou por aceitar o convite dum grego para almoçar. Alguns estranharam que ele tenha aceitado o convite. Saulo, afinal de contas, era judeu e, por isso, não lhe convinha meter-se com não judeus. Quem assim pensava eram judeus que já acreditavam em Cristo, mas ainda não tinham compreendido que, diante de Deus, não há judeu nem grego, nem homem nem mulher, nem escravo nem homem livre; apenas pessoas...