1. CORAGEM DUM JOVEM
 

 

Proibiram a Simão Pedro e João, e também aos seus amigos, falarem no nome de Jesus. Mas eles continuaram a fazê-lo sem receio. Os chefes do povo e os sacerdotes do templo, enraivecidos com essa atitude, começaram a pensar a sério em matá-los. Pensavam eles que essa era a única forma de acabar duma vez para sempre com o espectro desse tal Jesus de Nazaré...

 

Mas havia no sinédrio, ou seja, no conselho de sacerdotes, um doutor da Lei chamado Gamaliel, que era respeitado por todo o povo. Gamaliel tomou a palavra e disse aos seus colegas: «Homens de Israel, é preciso ter cuidado com o que fazemos a esses homens. Acho que devemos aprender da experiência. Conheceis certamente outras histórias como, por exemplo, a de Judas. Pois bem, ele foi um homem que conseguiu levar atrás de si algumas centenas de seguidores. E o que é que aconteceu depois? Simples: quando eles morreram, os seus seguidores dispersaram e tudo acabou ali...».

 

Os colegas de Sinédrio ficaram à espera que Gamaliel acabasse o seu raciocínio. E foi o que Gamaliel fez: «O que quero dizer é o seguinte: não vale a pena a gente meter-se com esses homens que se dizem seguidores de Jesus de Nazaré. Porque, das duas, uma: se a doutrina deles é uma invenção humana, então não durarão muito; mas, se se trata duma obra de Deus, então não conseguiremos destruí-los. Mais: corremos o risco de nos pormos em guerra contra Deus e, nessa altura, quem é que será destruído? Portanto (torno a repetir), é preciso ter cuidado!».

 

A assembleia ali reunida, depois de ouvir a exposição de Gamaliel, mandou os apóstolos embora. No entanto, ainda os mandaram primeiro açoitar para lhes meter medo. Só que agora isso de medo... não era com os apóstolos. Por isso, eles continuaram a falar de Jesus a toda a gente. E assim o número dos seguidores de Jesus ia aumentando cada vez mais. Com efeito, o número de crentes cresceu de tal maneira que, a um dado momento, houve que escolher mais pessoas para organizar os serviços essenciais para o funcionamento dos grupos que se iam formando.

 

Ora bem, um dos escolhidos era um jovem chamado Estêvão que andava com os apóstolos há bastante tempo. Estêvão era um jovem muito dotado. Além de ser competente nos serviços que fazia, sabia a Bíblia quase de cor e falava muito bem. Tanto que nem os grandes mestres estavam muito à vontade com ele a discutir, porque não era fácil resistir à forma como era capaz de expor as coisas...

 

A facilidade com que Estêvão discutia os assuntos começou a provocar a inveja e até a ira dos mestres do povo. Viam a sua autoridade posta em causa e isso eles não o aceitavam. Como consequência, tudo fizeram para o desacreditar. E até o chegaram a levar a tribunal, acusando-o sobretudo de dizer que a Lei de Moisés tinha que acabar, porque Jesus de Nazaré tinha vindo trazer outra Lei...

 

As discussões entre os mestres do povo e Estêvão foram-se avolumando. E o problema tornou-se tão grave que até meteu o Sumo-sacerdote. Então, um dia, Estêvão foi chamado e foi interrogado solenemente diante de todos: «É verdade o que dizem de ti?». Apesar da idade, Estêvão não se atrapalhou: «Bons mestres e cidadãos! Não me vou defender. Quero apenas contar-vos um pouco o que sei para demonstrar que não falei contra a Lei de Moisés...».

 

Fez-se silêncio entre os presentes. E Estêvão continuou: «O Deus do céu apareceu ao nosso Pai Abraão, quando ele ainda morava na Mesopotâmia. Ao mesmo tempo, convidou-o a deixar a sua terra e a ir para uma terra que lhe havia de mostrar. Daí, depois da morte do pai, Deus fê-lo imigrar para este terra onde agora habitamos. Não lhe deu qualquer propriedade, embora lhe tenha prometido tudo. O facto é que a descendência de Abraão chegou à terra onde nós moramos. Os hebreus foram feitos escravos e maltratados no Egipto durante 400 anos...».

 

Ninguém interrompia Estêvão. «Quando se aproximou o tempo em que se devia realizar a promessa feita a Abraão, o povo, que estava no Egipto, cresceu e multiplicou-se. Isso até ao dia em que subiu ao trono um novo rei que desconhecia a existência de José. Então esse rei fez o propósito de dizimar o nosso povo. Foi nessa altura que nasceu Moisés. Moisés foi criado durante três meses em casa, mas depois a filha do faraó recolheu-o e criou-o como se fosse seu filho. Da sua vida até à altura em que Deus lhe apareceu na terra já todos vós sabeis. Foi Moisés que nos fez sair do Egipto, realizando prodígios e milagre no Egipto, no Mar Vermelho e no deserto, durante quarenta anos...».

 

«Os nossos pais» – continuou Estêvão – «tinham no deserto a tenda com a Lei. E foi assim que os nossos pais, sob o comando de Josué, entraram no território conquistado às nações que Deus expulsou. Mas, com os tempos, os nossos pais desobedeceram à Lei de Moisés e todos sabemos o que aconteceu: foram feitos prisioneiros pelos babilónios. Apesar dos conselhos dos profetas, não quiseram obedecer. Mais, fizeram ainda pior: alguns dos profetas chegaram a matá-los; e a outros não os mataram porque não puderam».

 

E o resumo do discurso de Estêvão termina assim: «Como vedes, sempre fomos estranhos. Preferimos sempre seguir os falsos profetas, porque nos propunham coisas fáceis... Não temos, pois, que maravilhar-nos se as coisas não correram bem aos nossos antepassados. O mesmo poderá acontecer agora se não tivermos cuidado; se não dermos ouvidos ao Profeta por excelência que Deus nos mandou nos últimos tempos»...

 

Os chefes dos sacerdotes já ferviam por dentro e procuravam maneira de o apanhar em alguma. E a ocasião não tardou, quando ele disse o seguinte: «Vós, que me estais a ouvir, atenção ao seguinte: em toda a nossa história, temos sido pessoas de coração duro, temos sido teimosos, recusando-nos a aceitar a evidência e a distinguir os autênticos profetas. Opomo-nos constantemente aos autênticos profetas. Exactamente como os nossos pais. Eles mataram os profetas que previram a vinda de Messias. E nós que é que fizemos? Pior ainda: traímos e matamos o próprio Messias».

 

Nessa altura, a raiva explodiu mesmo. Estêvão, antevendo já o que lhe ia acontecer, disse-lhes ainda: «Eu vejo já o Filho de Deus, o Messias, à direita de Deus!». Eles então não resistiram mais. Um a um atiraram-se a ele, arrastando-o para fora da cidade. Aí começaram a apedrejá-lo. As testemunhas falsas depuseram as suas roupas ao pé dum jovem chamado Saulo. Mas, enquanto o apedrejavam, Estêvão, à semelhança do que fizera o próprio Jesus, limitava-se a dizer: «Senhor, perdoai-lhes, porque eles não sabem o que fazem!».