1. EXÉRCITO VITORIOSO

 

Um dia Deus apareceu a Gedeão e disse-lhe: «Vai e, com a força que tens, liberta Israel das mãos de Madiã». Gedeão ficou assustado: «Ó Senhor, como é que eu vou libertar Israel? A minha família é a última da tribo de Manassés e eu o mais novo da família! Mas, se é essa a tua vontade, dá-me um sinal de que estás comigo!». «Pois bem, seja como queres!». Gedeão respondeu: «Se encontrei graça diante de ti, não Te afastes deste local enquanto eu não voltar!».

 

E o Senhor esperou. Gedeão entrou em casa, preparou um cabrito e, com uma medida de farinha, fez pães sem fermento. Pôs a carne num cesto e o caldo numa panela, levou tudo para debaixo duma árvore e aí ofereceu-o ao anjo do Senhor. Este, estendendo a ponta da vara que segurava na mão, tocou na carne e nos pães ázimos e logo surgiu das pedras um fogo que consumiu a carne e os pães ázimos. Por este sinal, Gedeão reconheceu que era o anjo do Senhor. E, naquela mesma noite, tomou a decisão de ir libertar os israelitas do poder de Madiã...

 

No dia seguinte, saiu de casa e foi ter com os israelitas. Todos recuaram por causa de tudo o que tinha acontecido antes. Eles ainda não tinham esquecido a afronta que tinham recebido. Apesar de ter partido as estátuas dos deuses que eles tinham enterrado no campo por superstição, nada acontecera. Não tinha caído nenhum raio do céu para o castigar. Gedeão falou àquela gente neste tom: «Eu não preciso das estátuas destes deuses todos para nada. Não acredito nisso. E mais: tenho a certeza que esses deuses não nos protegem contra os madianitas. De resto, vós mesmos acabais de descobrir que deuses são. Não fizeram nada e nem sequer me castigaram, como vedes. Pois bem! Digo-vos uma coisa: vou combater sozinho contra esses madianitas. Quer dizer, eu só... com o nosso Deus...».

 

Gedeão chegou inclusivamente a perguntar se havia alguém que o quisesse acompanhar. E parecia tão seguro da vitória que logo alguns ali se juntaram a ele. É que assim as coisas também não podiam continuar. Já estavam fartos de ser gozados pelos madianitas. Em cada aldeia e em cada localidade em que passavam, pouco a pouco mais gente apoiava os seus planos. Começou então a enviar mensageiros para ver quem é que queria alistar-se. Até porque os inimigos, sabendo do que estava a acontecer, também se estavam já a preparar para a batalha.

 

O facto é que as coisas estavam de tal maneira complicadas que os israelitas acabaram por se alistar em massa. Tal era a vontade de derrotar os inimigos! Mas Gedeão, inspirado por Deus, viu que não era nada fácil levar a bom termo os seus planos com tanta gente. Não se tratava de batalhas a travar com milhares e milhares de pessoas. Como não queria ser o comandante dum grande exército, escolheu, após várias selecções, só os trezentos homens mais fortes e corajosos entre os que não tivessem medo de morrer. E foi com esses que ele começou uma luta persistente de resistência; uma espécie de guerrilha.

 

Atacavam os madianitas e os seus aliados de repente, em todas as oportunidades que se lhes deparavam e depois fugiam. Atacavam quando os inimigos menos esperavam e dificultavam-lhes a vida o mais que podiam. De resto, estavam a utilizar a mesma táctica que os próprios madianitas tinham usado contra eles. Os madianitas já não se sentiam seguros em nenhuma parte. Não é que tivessem medo (pelo menos disso estavam eles convencidos), mas, enfim, era preciso viver com tranquilidade e isso era o que eles agora não tinham.

 

Um dia, Gedeão arranjou um plano curioso. Tendo conseguido aproximar-se com os seus homens do acampamento do inimigo, Gedeão dividiu-os em três grupos de cem e entregou a cada um dos seus homens trombetas e jarras vazias e dentro das jarras uma tocha acesa. Qual a razão disso? É que ele tinha descoberto que, no exército inimigo, só um oficial é que podia carregar com uma tocha; os soldados não levavam tocha nenhuma. Era um costume deles e Gedeão aproveitou-se desse costume para os desbaratar...

 

Gedeão disse então aos seus soldados: «O que me virdes fazer a mim, fazei-lo vós também. E vai ser assim. Quando eu chegar aos limites do acampamento, imitai o que eu fizer: quando tocar a trombeta, então tocareis também vós as vossas trombetas em redor do acampamento». Gedeão chegou aos limites do acampamento com os seus cem homens, na altura em que estavam a mudar de guarda as sentinelas. Começou então a tocar as trombetas, quebrando ao mesmo tempo as jarras que tinham. Os outros batalhões fizeram a mesma coisa. E cada um ficou no mesmo lugar em volta do acampamento.

 

Os inimigos ficaram com a impressão de que estavam rodeados por um grande exército de todos os lados. Então perderam o controlo e começaram a fugir em todas as direcções. Os trezentos homens de Gedeão continuaram a tocar. Atrapalhados, os madianitas, meio estremunhados ainda, começaram a matar-se uns aos outros, julgando tratar-se de inimigos que já se tivessem infiltrado no acampamento... Entretanto, a notícia depressa se espalhou por toda a parte. Então vieram os outros e foram ao encontro dos madianitas, derrotando-os por completo.

 

Não contente com esta vitória, Gedeão e os seus homens aproveitaram a oportunidade para expulsar os inimigos daquela região. No caminho, foram encontrando outros que foram vencendo também. Depois destas façanhas todas, o povo disse a Gedeão: «Sê o nosso rei, tu, o teu filho e o filho do teu filho, porque nos livraste do poder dos inimigos». Mas Gedeão respondeu-lhes: «Não reinarei sobre vós, nem reinará o meu filho nem nenhum dos meus descendentes. Uma só coisa vos peço: que cada um me dê os anéis e objectos de oiro que apanhou ao inimigo». Eles entregaram-lhe esses objectos e então Gedeão fundiu uma estátua com eles. E talvez por isso, bem depressa os israelitas se desviaram dos caminhos rectos, caindo na idolatria. Seja como for, os madianitas foram humilhados e nunca mais puderam levantar a cabeça, de maneira que o país pôde gozar dum clima de paz por um período de quarenta anos.

 

Depois da morte de Gedeão, os israelitas apostataram de novo, esquecendo-se do seu Deus. E de novo começaram a manifestar o desejo de serem como os outros povos. Então um dos filhos de Gedeão, que se chamava Abimelec, deixou-se vencer pela ambição e foi ter com alguns anciãos e representantes do povo e disse-lhes: «Ouvi-me! O que será melhor: serdes dominados por setenta homens (que eram os chefes de todo o povo) ou por um só homem que seja vosso rei»? Os setenta homens a que se referia eram filhos naturais de Gedeão e das suas muitas mulheres legítimas e ilegítimas. O próprio Abimelec era filho duma concubina.

 

Abimelec, passando pela terra onde viviam os outros filhos de Gedeão, passou-os todos a fio de espada. Esperava assim poder vir a reinar sozinho sobre Israel. Mas, como quase sempre acontece com os que, para vencer os outros, se servem de meios ilegítimos, o novo usurpador acabou mal. Tinha cometido barbaridades demais para poder acabar bem. E, de facto, para vergonha do seu nome, acabou por morrer às mãos duma mulher quando estava em casa.