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Categoria: Domingos do Tempo Comum - Ano C
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fundo

 

1ª leitura (Sir 27,5-8): Quando se abana o crivo, apenas ficam as alimpas; do mesmo modo as palavras dos homens mostram o seu carácter e põe a nu os seus defeitos. O cuidado com uma árvore mostra-se no fruto; assim também a palavra manifesta o que vai no coração. Nunca louves ninguém antes de ele falar, porque é assim que ele se dá a conhecer.

*  A palavra dá a conhecer o homem

   Não se nota logo a ligação entre este pequeno trecho do livro do Ben Sirá (antes mais conhecido por Eclesiástico) com as outras duas leituras. A forma como está escrito não facilita a sua ligação com outros textos, porque se trata de um texto não unitário; ou seja, não é um livro «com cabeça, tronco e membros». É, isso sim, um texto constituído por curtas e rápidas frases lançadas à inteligência e ao coração das pessoas, para que tirem lições morais a pôr em prática. Daí que esse livro tenha sido tão usado logo ao início do cristianismo, quase como se não fosse um escrito tipicamente judaico. Em qualquer caso, no texto escolhido para este domingo, acho que a atenção deve ser focada na seguinte proposição: a palavra manifesta o que vai no coração das pessoas. É certo que, no que a Deus diz respeito, Ele se revelou, em primeiro lugar, através das suas obras (cf. Rm 1,19-29), porque não tinha aparecido ainda quem O ouvisse (digo eu). A propósito, este é um tema que é abundantemente tratado no capítulo 13 do Livro da Sabedoria. Agora, quanto ao que ao homem diz respeito, ele manifesta-se não só por aquilo que ele faz (as obras) mas também pelo que diz. Então, quase se poderia dizer que, quando apareceu quem O entendesse, também Deus se fez entender por meio da palavra. Di-lo claramente, a Carta aos Hebreus, logo ao início, quando escreve que Deus se revelou sobretudo através da Sua Palavra – que, como sabemos – é Jesus. Mas, mesmo assim, não se pode negar que esta primeira leitura – como, de resto, acontece com muita frequência – tem a ver com o texto evangélico, embora este seja bem mais exigente. Seja como for, para além de estar implícito que o autor do Ben Sirah nos quer dar a conhecer a pessoa humana, é também claro que nos oferece sobretudo um convite a conhecermo-nos a nós mesmos.

2ª leitura (1Cor 15,54-58): Quando tudo isto (a mudança de uma vida perecível para uma vida incorruptível) acontecer e quando o que é mortal se tornar imortal, então a Escritura realizar-se-á: «A morte foi destruída e a vitória é completa! Onde está, ó morte a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu poder de destruição?». O poder de ferir da morte advém do pecado e a força do pecado está na Lei. Mas sejam dadas graças a Deus que nos dá a vitória por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo! Portanto, meus irmãos, permanecei firmes e sempre inabaláveis no vosso trabalho pelo Senhor, uma vez que sabeis que nada do que fazeis ao serviço do Senhor será jamais inútil.

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*  A nossa fadiga não é vã no Senhor

   Focando agora a minha atenção no capítulo 15 da 1ª Carta aos Coríntios, eu diria que não se trata apenas de um texto para ler só frase a frase, mas sim como uma totalidade. Além do mais, não acho demais insistir no facto de que o tema fundamental de todo este capítulo é a ressurreição como tal. Os argumentos que Paulo usa para falar do assunto naturalmente fundam-se na fé, ou seja, no caso presente, na aposta que a gente faz na outra dimensão da vida, embora não estejamos em condições de a descrever enquanto não chegarmos lá. Este é um tema fundamental ou, como se diz agora, é um assunto incontornável, pois que, se a vida e a ressurreição de Cristo são só uma especulação e não produzem nenhum efeito, então, como Paulo diz mais que uma vez, o esforço de alimentar a nossa fé nele será em vão. Dito de outra maneira, arriscar ou apostar a nossa vida em alguém que não pode fazer nada em relação ao que se passa para além desta vida, é um contrassenso. Enfim, pode ser de bom tom afirmar que é preciso fazer as coisas sem estar à espera de nada; e, de alguma forma, faz todo o sentido. Ou seja, pode parecer um pouco egoista por parte do cristão estar à espera de uma espécie de «recompensa» na outra dimensão, mas, pensando bem, se, por hipótese, nada da outra dimensão é senão fantasia, então o ser cristão em nada se distingue do não ser cristão e então é de facto algo que se faz em vão, sem sentido. Será que a chamada ética secular (até há quem diga agora até ética republicana) tem qualquer significado? Bom, é certo que, nessa hipótese, eu tenho a possibilidade de estabelecer sempre alguns critérios (que, de algum modo, também se podem chamar «consciência») e ficar mais tranquilo ou, melhor, mais autossatisfeito, por seguir esses princípios na minha vida. Mas isso, no fundo, é pura e simplesmente o resultado de algo que eu próprio decido. Quando, porém, se fala de consciência no sentido rigoroso do termo, o ponto de referência - usemos a expressão - fica fora de mim, é Alguém que decide o que é bom e o que é mau.

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Evangelho (Lc 6,39-45): Jesus disse-lhes a seguinte parábola: «Um cego não pode guiar outro cego. Se o fizer, ambos cairão numa cova. Nenhum discípulo é maior que o seu mestre, mas todo o discípulo, depois de completar o seu tirocínio, será como o mestre. Porque olhais para o argueiro na vista do vosso irmão e não reparais na trave que está na vossa? Como podeis dizer ao vosso irmão: "Irmão, deixa-me tirar-te o argueiro da tua vista" e nem sequer sois capazes de tirar a trave que está na vossa? Hipócritas! Tirai primeiro a trave da vossa própria vista e então vereis claramente para tirar o argueiro da vista do vosso irmão. Não há árvore boa que dê maus frutos nem também árvore má que dê bons frutos. A árvore conhece-se pelos frutos. Não se colhem figos dos espinhos nem uvas dos abrolhos. Assim, o homem bom, da bondade do seu coração, tira o que é bom; e o mau, da maldade do seu coração, tira o que é mau. É por isso que a boca fala daquilo que abunda no seu coração».

 

*   A boca fala do que há no coração 

   A melhor forma de entrar no sentido do texto evangélico de hoje é começar por dizer que, segundo a mentalidade dos fariseus, uma determinada ação é boa se concorda com a Lei; e é má se não está de acordo com a Lei. Nesse sentido, é uma forma de pensar que se assemelha à forma de pensar dos que decidem por si mesmos o que deve ser critério de comportamento. Neste caso, chamar-se-á «consciência laica» ou coisa parecida. No caso dos fariseus, tratar-se-ia de uma espécie de «consciência legal». Ora, com base nestas premissas, parece-me que é precisamente o que não se deve deduzir do texto evangélico. Este tem que ser bem lido e dessa leitura tirar a lição pretendida; que passa pelo facto de ser Deus que determina se uma coisa é boa ou não. Ora bem, se Deus fala com os homens através do seu Filho, Jesus Cristo, então basta saber qual é a «opinião» de Jesus a respeito de um determinado facto ou comportamento para saber o que se  há-de fazer. E Jesus apela sempre para o coração, ou, se quisermos, para a consciência, que é como que a voz de Deus dentro de nós. E o facto é que Jesus, no fundo, declara que uma determinada ação é boa só quando procede dum íntimo bondoso, dum coração transparente. Daí que o autêntico discípulo de Jesus tenha que adequar a sua maneira de pensar à imitação do seu Mestre. Ora, se o discípulo não estiver totalmente aberto à luz de Jesus (cf. Jo 9,39-41), então não se pode chamar verdadeiramente discípulo. E, por isso, o que disser e fizer não estão em conformidade com a sua consciência. De qualquer forma, quer o seu agir seja louvável, quer seja reprovável, é sempre verdade que a sua boca fala daquilo que abunda no coração.

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q       * Conhecem-se as pessoas pela forma como se expressam.

 

          * Graças a Deus que nos dá a vitória por         Jesus.

 

        * Porque olhais para o argueiro na vista do vosso irmão e não reparais na trave que tendes na vossa própria vista?

A ÁRVORE CONHECE-SE PELOS FRUTOS.

 

   Por falta de tempo, limito-me a traduzir e a adaptar os comentários relativos a este domingo com base no «Messale dell'Assemblea Cristiana».

 

*   A Palavra que contesta

   «Para o cristianismo, a moral não é autónoma, não é independente, não se justifica por si mesma (como se fosse uma ética republicana qualquer), mas tem o seu fundamento na sua resposta às exigências do Evangelho. As exigências morais duma vida em conformidade com o Evangelho são expressas numa série de "ditos" (sentenças) do Senhor que o evangelista Mateus reuniu no chamado "Discurso da Montanha" e que Lucas resume no "discurso da planície"».

   «Esses discursos devem ser lidos sobretudo como o juizo de Deus sobre nós. E descobrimos logo que eles exigem de nós uma mudança radical. Não exigem apenas que nos comportemos de maneira diferente neste ou naquele pormenor ou setor particular, mas que reorientemos a profundidade da pessoa nas próprias fontes do agir. Ou seja, cada preceito particular põe em questão toda a vida; revela a força incondicional das exigências divinas. Diante desses preceitos, não podemos ufanar-nos de nós mesmos; obrigam-nos, ao contrário, a medir quanto esteja distante o que de melhor possamos fazer do quanto Deus nos pede. Eles são a verdadeira norma "objetiva" que serve de medida. Por isso, são um apelo a uma contínua conversão».

*  Apelo a um êxodo contínuo

   «Os preceitos do Senhor revestem-se, para além disso, de um novo aspeto: tornam-se como que as "indicações de marcha" ou sinais no caminho que devemos percorrer. Deste ponto de vista, os ensinamentos morais de Jesus diferem nitidamente da maior parte do ensinamento rabínico do seu tempo, cujo objetivo era sobretudo fornecer um quadro completo de regras e prescrições, de maneira que o indivíduo soubesse como confirmar a sua conduta, em qualquer situação em que se encontrasse à lei de Deus».

   «Os ensinamentos de Jesus, em linha de princípio, não são normas imediatamente aplidáveis, sem qualquer margem de dúvida, mas revestem-se quase sempre de uma formulação parodoxal. Ora, se apresentam um aspeto paradoxal é porque estão estritamente ligadas a uma resposta ao anúncio na fé. Levam-nos a tomar consciência da originalidade duma opção que não corresponde ao proceder espontâneo/instintivo do homem».