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Categoria: A história dum povo.
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  1. BURROS INTELIGENTES
 

 

Os judeus moravam há longos anos na terra que Deus lhes tinha prometido e que Josué acabara por conquistar. Cada tribo tinha o seu território demarcado. Mas ainda não viviam em segurança. Além do mais, eram geralmente pobres. Os últimos inimigos, os madianitas, tinham sido definitivamente silenciados. Por parte deles, não havia nada a temer.

 

Mas havia outros inimigos; como, por exemplo, os amalecitas e os filisteus. À semelhança de todos os outros, muitas vezes faziam guerra sobretudo para roubar. E o que não podiam levar para a sua terra incendiavam-no. Lançavam fogo às casas, aos campos semeados e a tudo. E não matavam só soldados. Matavam também indiscriminadamente mulheres, crianças e velhos indefesos...

 

Esta situação estava a tornar-se cada vez mais insuportável. Por outro lado, os judeus viviam demasiado divididos. Por vezes até se guerreavam umas tribos às outras. E, já se sabe, povo dividido é povo enfraquecido. Sendo assim, os inimigos naturalmente levavam a melhor. As derrotas seguiam-se umas às outras. Então, os chefes das tribos, e também o povo em geral, começaram a duvidar da protecção do seu Deus, dizendo: «Deus não nos ajuda, ou porque não quer ou porque não pode». E essa dúvida insinuava uma outra dúvida: «Quem sabe se os deuses dos outros não serão mais fortes do que o nosso?»...

 

Com o correr do tempo, começaram a pensar que o que era preciso era organizem-se como os outros povos. E, pouco a pouco, foi tomando forma uma ideia: «E se todas as nossas tribos se reunissem sob o poder dum só rei, como acontece com os outros reinos?! Se tivéssemos um único rei e um único chefe para todo o povo, teríamos muitas mais probabilidades de sobreviver!».

 

Nesse tempo, vivia naquela terra um profeta chamado Samuel. E o povo foi ter com ele para lhe pedir um rei. Segundo eles, essa era a única forma de se governarem. Por outro lado, os juízes que estavam à frente dos seus destinos eram corruptos e indignos. Ora bem. Havia um homem da tribo de Benjamim que tinha um filho chamado Saul, um jovem de bela presença...

 

Uma manhã, faltaram ao pai de Saul algumas das suas jumentas. Então fez-lhe o seguinte pedido: «Olha, Saul, é melhor ires tu a procurar as jumentas. Um dos nossos criados irá a acompanhar-te». Naquele tempo, como de resto ainda hoje, era perigoso ir sozinho para muito longe. Era muito possível que encontrassem pessoas com más intenções ou até soldados inimigos. E assim, de facto, Saul levou consigo um dos seus servos. Procuraram vários dias, mas não encontraram as malditas das jumentas...

 

Após vários dias de buscas, Saul disse para o criado: «Vamos mas é para casa. Senão o meu pai começa a preocupar-se não pelas jumentas mas por nossa causa». O criado respondeu-lhe: «O meu senhor tem razão, mas espere. Não é por aqui que mora por acaso um homem célebre, um homem de Deus, um tal Samuel? Talvez ele nos possa indicar o caminho para encontrar as jumentas!». «Bem, concordou Saul, já agora, não nos custa nada tentar. E lá se dirigiram eles para a cidade onde morava esse homem de Deus.

 

Quando chegaram à cidade, viram um homem que falava com um grupo de pessoas: «Vocês insistem mesmo em ter um rei? – dizia o homem – Pois bem! Mas lembrem-se que o rei pode cobrar a décima parte de tudo e pode obrigar os vossos filhos a ir para a tropa para cuidar dos cavalos e das terras dele, sem pagar nada a ninguém por esses serviços. Tendes a certeza que é isso que quereis»? Entretanto, Saul aproximou-se do grupo e intrometeu-se na conversa: «Desculpem, não me poderiam dizer onde é que posso encontrar um senhor que se chama Samuel»? «Sou eu mesmo!» – respondeu o homem que estava no meio do grupo – «e tu quem és»? Saul contou-lhe quem era e donde vinha. Samuel então convidou-o para passar a noite em sua casa...

 

Pelo caminho, Saul disse a Samuel: «Pelo que me foi dado a entender da conversa de há pedaço, parece que não acreditam muito na ideia dum rei. Mas os reis serão todos maus? Eu acho que também pode haver reis bons para o povo». «Bom, o que eu acho é que não devia haver rei, porque Deus é que deve ser o nosso rei». «Mas eu acho» – insiste Saul – «que Deus também pode servir-se duma pessoa para governar as outras. E porque não»? Samuel então olhou demoradamente para e ele e depois seguiram o caminho.

 

Chegados a casa, Samuel levou Saul e o criado para a sala de jantar. Havia uma reunião importante. As pessoas já andavam a falar muito sobre a necessidade de ter um rei. E esse jantar tinha essa finalidade. No fim do jantar, Samuel ficou ainda muito tempo a falar com Saul. Então, a uma determinada altura, disse: «Tu achas que Deus te vai ajudar se encontrares as jumentas? Eu não acho que seja bem assim. O que acontece é que Ele se serviu das jumentas para eu te encontrar a ti. É que sinto cá dentro que o homem que Deus escolheu para combater os filisteus és precisamente tu!»...

 

Saul ficou boquiaberto ao ouvir estas palavras de Samuel. Mas Samuel não quis dar mais explicações. E, no dia seguinte, Samuel foi acordá-lo e disse-lhe: «Agora podes voltar para casa». E acompanhou-o durante algum tempo, como era costume eles fazerem. Após um pouco de caminho, Samuel disse a Saul: «Diz ao teu criado que vá andando. Eu quero comunicar-te o que Deus me inspirou acerca de ti». Samuel tomou então um pequeno frasco com óleo, derramou-o sobre a cabeça de Saul e abraçou-o dizendo: «O Senhor ungiu-te rei sobre o seu povo». E, logo depois, afastou-se do local, dizendo a Saul para voltar para casa.

 

Quando Saul saiu dali com o seu criado, encontrou pelo caminho dois homens junto dum túmulo, já no território pertencente à tribo de Benjamim. Eram conhecidos. Depois dos cumprimentos, eles disseram a Saul: «Soubemos que andais à procura dumas jumentas. Pois bem, as jumentas já foram encontradas. O vosso pai já não se preocupa mais com isso. Mas está em cuidados por causa de vós, pois sabe o que vos terá acontecido... Voltai depressa para tirar o vosso pai de cuidados!».

 

Saul e o seu criado apressaram-se a regressar a casa. Entretanto, enquanto percorriam o caminho, Saul sentiu que algo de especial lhe estava a acontecer. As palavras daquele profeta não lhe saíam da cabeça. Samuel dissera-lhe uma série de coisas que o não deixavam em paz. Aquilo transtornara-lhe completamente o cérebro. E mais transtornado ficou quando encontrou pelo caminho um belo grupo de jovens todos entusiasmados. Davam louvores a Deus e falavam de novas formas de governar Israel. Como é que isso era possível? Era uma manifestação muito estranha. Saul ficou realmente intrigado. Mas reflectiu e nisso tudo viu também o dedo de Deus. Deus queria dele qualquer coisa e ele tinha que estar preparado.