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Depois da morte de Josué, as tribos de Israel foram fiéis ao Senhor durante alguns anos. Mas, depois, com o decorrer do tempo e com a abundância que tinham acumulado, foram-se esquecendo pouco a pouco do seu passado. E começaram também a alimentar desejos de supremacia sobre as outras tribos. E assim perderam a unidade entre elas. Nessas circunstâncias, e como é natural, os povos vencidos começaram a revoltar-se de novo... Entretanto, tinha aparecido, no horizonte da política daqueles povos, uma nação mais aguerrida que Israel. Tinham o nome de madianitas por terem tido início numa zona chamada Madiã...
E o que se sabe é que os israelitas acabaram por cair nas mãos desses homens, que eram bons guerreiros. Um dia, um israelita chamado Joás caminhava, com o seu filho, ao longo do rio Jordão. Depois duma curva do rio, chegaram a uma clareira, onde havia um círculo feito de pedras. Eram as ruínas duma fortificação.
«O que é que são aquelas pedras ali, pai»?, perguntou o miúdo, «posso ir brincar para lá»?
«Não, não podes, meu filho. Mas vou contar-te a história dessas pedras.
Foi precisamente aqui neste local que os nossos antepassados atravessaram o rio Jordão. Isso deu-se no tempo de Josué, que foi um homem muito forte e valente. Josué era um homem de Deus, como Moisés. Josué foi o sucessor de Moisés, como eu te disse da outra vez, lembras-te»?
O garoto lembrava-se muito bem da história de Moisés. Mas ainda não sabia muito sobre esse homem chamado Josué, embora tivesse vivido depois de Moisés.
«Pois bem, continuou o pai, isso foi já há muito tempo. Aqui, precisamente neste lugar, Josué ergueu doze altares para lembrar cada uma das doze tribos da nossa pátria. É verdade, meu filho, o nosso povo ficou constituído em doze tribos. E estás a reparar do outro lado do rio? Aquele monte de ruínas? Não vês aquelas palmeiras além e entre elas montes de pedras? Pois bem, lá em cima, havia uma cidade. Chamava-se Jericó.
Jericó era uma cidade que já existia quando os nossos antepassados chegaram ao local. A nossa gente conseguiu vencer todos os inimigos. Mas ali não conseguiram entrar.
Assaltaram essa cidade durante sete dias. Depois, deram mais sete voltas em redor da cidade, mas não conseguiram nada. Mas, depois disso, de repente, diz a história que alguns tocaram as suas trombetas com toda a força e outros começaram a gritar com tanta força que os muros acabaram por ruir, por se desmoronar. Isso foi um sinal de que Deus estava connosco. E foi assim que nós tomámos definitivamente esta terra.
O menino não ficou muito convencido pela descrição feita pelo pai Joás.
E Joás notou isso mesmo: «Olha, meu filho, eu só posso contar essa história como a sei. É verdade que nós estamos a sentir cada vez mais dificuldades por causa dos madianitas que nos estão sempre a fazer guerra.
Pois é, nós estamos cada vez mais pobres e somos também cada vez mais fracos. Mas, olha, precisamente por isso, é preciso lembrarmo-nos do passado para ver se conseguimos vencer as dificuldades...».
O rapaz ficou a pensar e, depois duns minutos de silêncio, disparou, que é uma maneira de dizer:
«Mas... então o nosso Deus já não faz milagres hoje»?
«Bom, meu filho, respondeu-lhe o pai, se não queres acreditar, não acreditas, mas eu acho que é verdade o que te contei».
O certo é que o miúdo nunca mais esqueceu aquela história.
O nome do rapaz era Gedeão. Na época em que ele cresceu e se fez homem, de facto o seu povo ainda passava muitas dificuldades. As pessoas viviam apavoradas pelos constantes ataques dos madianitas. E esses inimigos não chegavam só para roubar mantimentos e dinheiro. Queimavam também as searas e os campos. E nisso a intenção deles era muito clara. A finalidade era tornar a terra mais pobre, obrigando os israelitas a morrer à fome e à míngua e finalmente obrigá-los a entregar-se. E mais: não matavam apenas os soldados, mas também as mulheres e as crianças. Quem quisesse salvar a família, tinha que fugir para as montanhas.
E a situação geral do povo era esta: miséria e contínua perseguição. É certo que apareceram alguns homens inspirados por Deus para lhes lembrar a história do passado e para lhes contar sobretudo como Deus os tinha ajudado a sair do Egipto. Mas os israelitas não quiseram saber. O próprio Gedeão não quis acreditar muito nessas palavras de consolação quando um profeta veio falar ao povo dessas coisas. Ele era um homem que gostava de saber a razão das coisas. E então perguntava-se a si mesmo: «Ora, ora, se o Senhor está com Israel, então porque é que nos acontecem tantos males? Onde estão os prodígios que nos contam os nossos pais»? E, de facto, não acreditou que fosse possível os israelitas verem-se livres dos inimigos enquanto ele próprio não constatou esses mesmos prodígios...
Entretanto, as dificuldades continuavam. E os israelitas iam sendo encurralados pouco a pouco nas zonas montanhosas. E chegou uma altura em que os terrenos de que dispunham se reduziam ao mínimo. Lembraram-se então de enterrar nesses terrenos umas estatuetas que tinham lá em casa para ver se isso lhes dava sorte. Isso não tinha nada a ver com o que Deus pedia a Moisés e a Josué. Era pura e simplesmente superstição. Mas eles lá pensavam com os seus botões: «Bom, nunca se sabe! Os outros povos também fazem isso... por isso, não deve haver mal nenhum. Por exemplo os próprios madianitas, nossos inimigos, fazem isso, e a vida corre-lhes bem. Talvez também nós tenhamos essa sorte».
{ Mas, com a história das estatuetas é que Gedeão ficou furioso. No dia seguinte, de manhã muito cedo, o pai de Gedeão ouviu gritos e berros ao pé da sua casa. Abriu a porta. O que tinha acontecido? Eram os vizinhos que berravam: «As nossas estátuas da sorte estavam enterradas nas nossas herdades e alguém de noite quebrou-as todas. Com certeza que isso vai trazer-nos má sorte. De certeza que foi o seu filho!», gritaram eles para Joás. Ele julga que é melhor do que nós, só porque acreditamos também nos deuses desta terra... Pois pode ficar certo que ainda no-las vai pagar. Que tem ele que se meter nas nossas vidas? Se calhar, ele tem maneira de resolver os nossos problemas?»... }
O facto é que as coisas estavam realmente a piorar a olhos vistos. E os israelitas parece que não viam outra forma de resolver a sua situação senão adaptando-se às circunstâncias. Ou seja, como é que podiam resolver os seus problemas senão procurando fazer, por assim dizer, as pazes com os madianitas? Estes eram mais fortes do que eles. Tinham conseguido reduzir os israelitas à miséria. E estes começaram a pensar que, se não utilizavam os métodos deles, acabavam por ser completamente arrasados. E como eles queriam salvar as suas vidas e a vida dos seus próprios filhos, então estavam dispostos a sujeitar-se aos madianitas.
Joás ouviu-os com toda a atenção e também com um certo receio pelas atitudes que pudessem tomar. E como é que ele lhes iria dar explicações que os satisfizessem. Só que as pessoas, quando a necessidade urge, vão sempre encontrar forças não se sabe bem onde. E então, Joás, de repente lembrou-se de lhes dizer: «Calma, calma, meus amigos! Um momento. Se é como dizeis, se isso vai causar má sorte (e, se calhar, até tendes razão, não sei!), então os deuses dos próprios madianitas irão castigar o meu filho e não a vós. Ele desrespeitou-os e, portanto, se fez alguma coisa de mal, será castigado por eles, e não vós. Não vos parece?». Bom, o facto é que eles lá se acalmaram e desfizeram o ajuntamento.