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Categoria: A história dum povo.
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  1. GREVE HÁ 3500 ANOS

 

Desde a saída dos hebreus do Egipto, tinham-se passado seis meses. Eles tinham visto morrer no Mar Vermelho os soldados egípcios que os perseguiam. Mas ainda estavam com um pouco de medo. Talvez fosse o receio de que o rei do Egipto mandasse outras companhias de soldados para lhes dar caça. Por outro lado, lembravam-se com alguma saudade do Egipto, pois a vida ali no deserto não era nada fácil e agradável. Havia falta de tudo. Começaram então a mostrar a sua insatisfação. Moisés ouvia-os cochichar uns com os outros. Eram meias palavras, eram murmurações entre dentes, que demonstravam o seu descontentamento...

Moisés, que era homem de carácter fogoso, começou a ficar aborrecido com tanta murmuração. E disse-o claramente. Foi então que alguém lhe disse assim: «Bem, a verdade é que, quando estávamos no Egipto, não nos faltavam aqueles bons pedaços de pão que misturávamos naquela sopa saborosa. O que se sabe é que estamos para aqui e nem sequer temos que comer. Quando reparo no estado em que nos encontramos, fico com a vontade de cair morto no chão... Para nos acontecer isto, era preciso ter tido tanto trabalho? Se era para morrer, bem podíamos ter ficado no Egipto. Era escusado andar agora dum lado para o outro como ovelhas tontas»!

 

Moisés ficou mesmo de todo e não aguentou: «Ah ele é isso?! Vocês querem voltar a viver na miséria e na escravatura? Então vocês não confiam no Deus dos nossos pais»? «Ninguém está a dizer isso!» – insistiu outro – «Nós estamos é a falar de comer. Primeiro a comida. Depois é que falaremos de Deus». Nesta altura, Moisés não aguentou mesmo: «Então foi Deus que me ordenou para vos tirar do Egipto, foi Ele que fez aqueles prodígios todos, foi Ele que vos ajudou a atravessar o Mar Vermelho, é Ele que se preocupa com a vossa vida e vós... não acreditais nele? Então achais que Ele vos tirou do Egipto para acabar convosco aqui no deserto? Bonito reconhecimento, sim senhor»!

 

O povo ouviu a palestra de Moisés e ficou com um certo receio. Até que um outro procurou pôr água na fervura: «Está bem, tens razão, mas o facto é que estamos para aqui a morrer à fome e à sede». E Moisés: «E achais que eu é que tenho a culpa, não é?! Realmente não sei o que dizer! Agora o que sei é que Deus não nos vai abandonar. Haveis de ver que Ele vai vir em nosso auxílio mais depressa do que julgais!»...

 

No outro dia (era quase o pôr-do-sol), Moisés apontou para o céu de repente dizendo: «Reparem, reparem como voam na nossa direcção! Reparem bem onde é que as aves vão pousar. Pois bem, muita atenção. No lugar onde poisarem, ide lá a correr e apanhai-as. Vede como elas estão já a poisar. Vá, vamo-nos a elas»! E, de facto, sem fazer muito barulho, caminharam até ao local onde as aves tinham pousado.

 

Lá encontraram muitas aves que no Outono voam em direcção ao Sul. De noite, ficam exaustas e praticamente não se mexem por causa do cansaço. Então é fácil apanhá-las. E assim, nessa noite, os hebreus, aproveitaram a oportunidade. Eram codornizes. E fizeram uma refeição como já há muito tempo não faziam. Comeram tanto que facilmente esqueceram as saudades da comida do Egipto.

 

Mas também as codornizes se acabaram... Então começou novamente o cochichar daquela gente. Começaram a protestar novamente com Moisés. E Moisés zangou-se outra vez com eles. Então não tinham atravessado o mar a pé enxuto? Então não tinham sido salvos das tropas egípcias? Então não tinham sido alimentados com a carne de codornizes? Então, Moisés determinou o seguinte: «Amanhã de manhã, levantem-se cedo»! Na manhã seguinte, lá estavam todos a bocejar e sem saber o que deviam fazer. O sol afastou a neblina. «Reparem – exclamou Moisés – os arbustos estão todos cheios de pequenas sementes. Experimentem ver se dá para comer»! E, de repente, estavam todos agachados para apanhar as sementes...

 

Moisés falou então assim ao povo: «É assim a vida no deserto. É através destas coisas que nós devemos aprender quem é Deus. Não é fácil compreender estas coisas, mas é preciso que nos esforcemos por isso... Tende confiança. Lembrais-vos das codornizes e do maná? Pois bem, Deus vai-nos dar todos os dias o nosso maná, a nossa comida. O suficiente todos os dias para viver. O nosso Deus não é um Deus que só está lá em cima nos céus, lá longe, sentado num trono. Não, é um Deus que está aqui entre nós e que nos acompanha na nossa caminhada. Portanto... coragem e para a frente!».

 

O povo acalmou e continuou a caminhada. À medida que se iam deslocando dum lado para o outro, os fornecimentos de maná iam aparecendo todas as manhã e eles recolhiam-no e assim tinham a subsistência garantida.

Moisés e o povo foram caminhando sempre pelo deserto fora. Mas, a determinada altura, acabou-se a água e não havia poços em parte nenhuma. E fazia tanto calor! Aquilo era o fim, era a morte! E as pessoas começaram a reclamar e, mais uma vez, gritavam por Moisés: «Se não nos arranjas água, morremos todos de sede. Tu é que nos trouxeste para aqui. Trouxeste-nos para aqui para nos matar à sede? Mas existe mesmo esse Deus de que tu tanto falas? Dá-nos uma prova de que Ele existe. Agora mesmo!». Moisés pensou para consigo: «Mas que raça de gente! Que é que vou eu fazer com esta cambada de refilões?! Julgam que basta eu interceder para as coisas acontecerem!». Mas o facto é que mais uma vez ele tinha que resolver a situação.

 

Os protestos continuavam. A sede apertava e os hebreus no deserto começavam já a sentir muitas dificuldades. Então Moisés recolheu-se e fez esta súplica ao Senhor: «Que hei-de fazer com este povo rebelde?». Depois, chamou alguns chefes do povo consigo e foi procurar água. Com os olhos repassou as vertentes dos rochedos. Devagar, subiu até chegar a uma fenda numa rocha. Com o bastão que tinha feito tantos prodígios no Egipto bateu contra a pedra e pensou assim: «Meu Deus, por favor! Se não encontrar água, o povo vai desesperar e isso só vai piorar as coisas!». Moisés teve sorte: realmente começou a jorrar água de onde ele tinha batido com o bastão... E toda aquela gente berrava de alegria...

 

O próprio Moisés não sabia explicar o que tinha acontecido. Não sabia o que pensar de tudo isso. Tinha feito de conta que sabia de magia, mas era só para ajudar os outros e para que acreditassem de novo em Deus. Não entendendo, afastou-se desse local e sentou-se para reflectir. Saiu-lhe então espontânea esta prece: «Senhor, meu Deus, o que será de mim, do meu irmão e dos meus familiares se o povo só acreditar em Ti quando acontece um milagre, algo que os espanta e os deixa boquiabertos?! Senhor, tem paciência com eles. Ainda hão-de aprender. Também eu, de vez em quando, perco a paciência. Não devia fazê-lo, mas por vezes esse sentimento é mais forte do que eu. Mas Tu, Senhor, perdoa-lhes estas fraquezas! Com o tempo ainda vão aprender!».