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Aquele dia marcou para sempre o destino do povo hebreu. Moisés reuniu a assembleia do povo e disse-lhes em tom solene: «No dia 10 do próximo mês, preparem-se para uma longa viagem. Juntem apenas as coisas e os mantimentos que não se estraguem logo. Tomem um cordeiro por família. Nesse dia, imolá-lo-ão e com o seu sangue porão um sinal na soleira da porta. Preparem-no muito bem. Preparem também pão sem fermento e algumas ervas. Será a última vez que comeremos no Egipto. No dia seguinte, partiremos finalmente»!
O faraó não queria de maneira nenhuma dar o braço a torcer. Mas, finalmente, viu-se obrigado a admitir que não podia fazer nada. No Egipto, a situação piorava a olhos vistos. E eram precisamente os hebreus os que mais se queixavam. Eram sempre eles os que mais protestavam. E era natural, porque eram eles os que mais sofriam os desmandos do faraó. Estavam revoltados com a situação...
Mas agora, às tragédias anteriores juntava-se mais uma; a mais grave de todas. Como Moisés tinha predito, a tragédia final tinha acontecido: todos os primogénitos das famílias egípcias tinham morrido; incluindo o próprio filho do faraó. Ninguém tinha sido poupado, a não ser os primogénitos das famílias que tinham o sinal de sangue na soleira da porta. O faraó ficou triste e assustado. Nesse momento, o que ele queria era esquecer os hebreus o mais depressa possível. O que ele queria era ver-se livre daquela gentalha toda, que só sabia reclamar e protestar...
Enquanto o faraó praguejava, os hebreus ainda estavam em casa e desconheciam o que tinha acontecido. Moisés falava ao filho Gerson nestes termos: «Olha, filho, nós vamos sair desta terra. Por isso, tens que ficar acordado esta noite, percebes»? «Sim, percebo... mas, o que é que está a acontecer? Porque é que esta noite é diferente das outras»? «Espera e verás... muito em breve! Olha, vem ajudar-me a preparar o necessário para a viagem, que vai ser demorada»! A sua mãe Séfora também estava toda atarefada. De repente, alguém bateu à porta. Moisés foi abrir. Era alguém que trazia a boa notícia: o faraó tinha decidido deixá-los partir.
Partiram, era ainda de noite, sem darem nas vistas. Parecia gente sem eira nem beira. Não seguiram pela estrada principal, porque era aí que os soldados egípcios montavam a guarda; e podiam não estar ainda avisados da decisão do faraó. Preferiram seguir por um caminho que ia pela beira-mar; um caminho certamente mais perigoso, mas que dava mais garantias de poderem finalmente deixar aquela terra maldita.
Entretanto, de manhã, o faraó, pensando bem no assunto, ficou muito preocupado. É que não se tratava apenas da falta que os hebreus faziam nos trabalhos de construção. Assim, os empreendimentos começados nunca mais seriam acabados sem o contributo dos hebreus. Era também outro motivo mais grave: que é que iria pensar o seu povo, o povo egípcio, perante um acontecimento do género? Não iria o povo pensar que ele, o grande rei do Egipto, era um covarde deixando partir os hebreus?
O faraó reuniu então todos os seus homens de confiança e começou aos berros: «O quê? Dizem que eu é que dei licença para que os hebreus se fossem embora? Isso é tudo mentira! Desta boca não saiu sequer uma única palavra nesse sentido! O que eu realmente disse foi isto: “Não pensem que me podem desobedecer e não ser castigados!”. Então, vamos a eles. Soldados, atrás deles! Temos que os apanhar antes que seja tarde! E, se for preciso lutar, pois lutaremos. Soldados, mostrai que sois valentes. De resto, não vai ser muito difícil, porque nós somos muitos e, além disso, temos cavalos e carros e eles não têm nada»!
Os hebreus não podiam saber desta recente iniciativa do faraó. E, chegados, finalmente, à beira-mar, prepararam-se para atravessar. As águas não eram muito profundas, mas, em todo o caso, aquilo não era nenhuma brincadeira. E alguns começaram a ficar assustados. Quase que já queriam voltar para trás. Só que, ao viraram-se para o outro lado, viram lá ao longe um grande números de carros e cavaleiros que vinham em sua perseguição. Imagine-se o que terá passado pela mente de toda aquela multidão! Eram calafrios, era o desespero, era a raiva.
E os insultos contra Moisés começaram logo: «Então, trouxeste-nos para aqui para quê? Para nos matar? Para morrermos às mãos dos egípcios? Não havia lugar no Egipto para a nossa sepultura, que era preciso trazer-nos para este lugar deserto? Vá responde! O que é que nos resta fazer? Diante de nós, está a morte e mais nada».
E o desânimo e o desespero começaram a apoderar-se deles. Moisés viu a coisa mal parada e teve que intervir imediatamente: «Coragem, meus amigos! Agora é que não podemos voltar para trás. Não podemos perder tempo. Temos de prosseguir rapidamente. Vamos lá. Ficamos aqui a olhar uns para os outros é que não resolve nada. Assim é que morremos todos. Temos que fazer alguma coisa. Tendes que acreditar que, se Deus nos ajudou para sair do Egipto, não nos vai deixar ficar aqui agora! Podemos salvar-nos, porque Deus está connosco!».
Moisés procurou ser parco nas suas palavras de encorajamento, até porque não havia tempo a perder. Pôs-se à frente do povo com o rosto bem voltado para a frente, quando já começava a clarear a aurora do segundo dia. E, de repente, um vento forte empurrou a água do mar para longe... Assim, os judeus puderam passar todos. Se o vento tivesse mudado de direcção nesse momento, isso teria sido a morte certa de todos, ter-se-iam afogado todos. Mas a verdade é que eles puderam passar a vau naquele lanço de mar cujas águas não eram profundas. Apesar de tudo, a travessia não foi fácil. Avançava-se devagar...
Entretanto, os soldados do faraó continuaram a vir no encalço deles. Todavia, também eles não avançavam muito depressa, porque tinham que carregar consigo material pesado. De resto, os cavalos escorregavam e estavam nervosos. Havia muita dificuldade em guiar os carros, por causa do lodo e também por causa da areia...
Quando os hebreus chegaram finalmente à outra margem, olharam para trás e viram uma nuvem negra no Oeste. O vento mudara de direcção. Então abateu-se sobre o local uma forte tempestade e a água do mar foi sendo empurrada novamente para o lugar onde estava antes. Os egípcios não se aperceberam logo da mudança de condições atmosféricas e, quando o fizeram, já era tarde. Foram ficando literalmente encurralados pelas águas. Não podiam ir nem para a frente nem para trás. Gerou-se depressa a confusão e acabaram por ficar todos afogados. Eles e os seus cavalos. Por alguns momentos, houve um silêncio sepulcral. Mas, depois, os hebreus, começaram a falar todos ao mesmo tempo e a gritar. Fizeram algazarra, festejaram, dançaram ali mesmo na margem do mar. O milagre tinha acontecido: finalmente estavam livres do jugo dos egípcios!